Política do improviso

O mais polêmico cronista da geração dos anos 1960, Carlinhos Oliveira assinava antológica crônica no Caderno B no Jornal do Brasil. Morreu em 1986 de pancreatite crônica, “ferido de morte pela doença, envelhecido, desdentado, maltratado”, para usar de suas próprias palavras.

Craque no humor, o cronista tinha um mérito permanente: a linguagem coloquial, sofisticada, com um timbre da mais refinada literatura. Uma permanente interação entre o cotidiano do jornalista e boêmio profissional e a vida política, social e cultural do Rio de Janeiro. Dia após dia, sobretudo, Oliveira registrou os humores do Brasil, antevendo o futuro:

“Dizem do brasileiro que é um ser lúdico: o homem que brinca. Queremos dizer: não é um ser moral. Mais adiante um pensador avança a teoria de que esse homem não tem caráter; vem um escritor e num passe de mágica, ou seja, ludicamente, inventa a saga do herói brincalhão, sem nenhum caráter, exposto a mil e uma metamorfoses, o malandro inocente, Macunaíma. Chegamos ao homem cordial: aquele que pensa com o coração. De tudo isso, porém, não sobra nada. Ficamos com o enigma à nossa frente: o brasileiro. Que espécie de animal racional é esse? Seria um quadrúpede degenerado, que teria nascido com dois pés antes de percorrer o caminho evolutivo da espécie? Porque, se há uma coisa que não se pode negar é que o brasileiro se improvisa. O brasileiro não é: ele se faz, mas não se faz em definitivo: ele se experimenta; troca de ideias como as cobras trocam de casca. É um ser experimental”.

Depois de abandonar a casca de Luis Inácio Lula da Silva, a ex-candidata Marina Silva foi se reinventar no PSB de Eduardo Campos, ninho de Ronaldo Caiado, Jorge Bornhausen, Heráclito Fortes e outros suprassumos da geleia geral da oposição.

Se Carlinhos Oliveira ainda hoje perambulasse pelas noites cariocas, ele escreveria assim num guardanapo: “Marina Silva não se faz em definitivo: ela se experimenta. É um ser experimental”.