Origens da Noite Branca

O texto que segue faz parte do capítulo “Adeus ano velho, feliz ano novo”, do meu livro “Maria Batalhão – Memórias póstumas de uma cafetina”.  

******

O pano branco, saibam as mães de santo, não estava lá em respeitosa devoção a oxum. No Brasil, a tradição — ou a superstição — de usar roupas brancas e cuecas amarelas na noite de Ano Novo é bem recente. No Paraná, Iemanjá tinha pouquíssimos súditos e, apesar de todo esforço de Dorival Caymmi e das cantoras do rádio, o serviço de propaganda da Bahia só funcionou efetivamente depois do casamento do poeta Vinícius de Morais com a baiana Gesse Gessy.

Deve-se à Rede Globo a conversão da classe média brasileira aos ritos africanos na virada do ano, com suas cores e canções. No entanto, devemos a Marco Polo a primazia de saber que o ano-novo chinês, que segundo os cálculos tártaros começava em fevereiro, era chamado simplesmente Branco. Conta o viajante veneziano que os súditos se vestiam com roupas brancas e, depois de ofertar ouro, prata, pérolas e pedras preciosas ao grande senhor da Ásia, os convidados se abraçavam e se beijavam, exclamando antes da orgia: Boa sorte para você neste ano e que tudo o que faça saia bem.       

Além dos rituais pagãos, também não constavam da agenda social da introvertida colônia de imigrantes do sul do Brasil os fartos banquetes, foguetórios e outras festivas superstições pela virada do calendário. O réveillon, longe de se comparar com a atual celebração ao consumo e zelos de sorte e azar, não passava do bimbalhar dos sinos da Catedral e demais igrejas da paróquia.

Na prima noite do 1900 — quando morì Giuseppe Verdi —, coube aos recém-chegados imigrantes italianos uma das maiores demonstrações de fé até então realizadas no Brasil: numa mistura de paura e coraggio, os oriundos dos alpes trentinos escalaram as mais altas montanhas em suas novas terras e, depois de acampados nos cumes, acenderam imensas fogueiras para anunciar ao universo que ainda estavam vivos e crentes no futuro.