Nem tudo está perdido neste mundo de Deus. Depois que o povo brasileiro deixou o futebol de lado e passou uma semana discutindo os prós e contras dos “embargos infringentes”, chegamos à conclusão que está na hora de se fazer um campeonato brasileiro de bolinha de gude. Podemos começar por Curitiba, no Passeio Público, nessa cidade onde é possível realizar até uma regata de pedalinhos.
Bolinha de gude é o jogo de nossa infância, com bolinhas de vidro, que em partes diversas do Brasil é conhecido por bolita, búraca, búrica, búrico, peca, firo, ou quilica. Se muitos imaginavam as bolinhas de gude perdidas em alguma gaveta do passado, ou num canto qualquer da memória, pois fiquem sabendo que depois da recaída do Supremo Tribunal Federal, a melhor coisa a se fazer é jogar quilica.
Não basta apenas recuperar as bolinhas de gude do fundo do baú. Mais que isso, é preciso reivindicar a inclusão do búrico no rol dos esportes olímpicos. O que é perfeitamente justo, confrontando o pacífico jogo com esse distúrbio mental chamado UFC, barbarismo televisivo que ainda insistem em chamar de esporte.
Se nos seus primórdios as bolinhas eram feitas de pedra, madeira, argila ou autêntico mármore, no século XV elas ficaram chiques, quando começaram a ser feitas de vidro, em Veneza e na Boêmia. No século XVII apareceram bolas de gude de porcelana e louça. As bolinhas de aço nunca foram bem recebidas, pois, ao enfrentar bolas de outro material, causavam danos nas demais. De Veneza ou da Boêmia, mesmo feitas de ouro, nenhuma delas se compara às multicoloridas bolinhas da nossa infância.
Em outra época, em outra circunstância, o escritor Antônio Calado estampou na abertura do livro “Bar Don Juan” a frase do poeta W.H. Auden: “Quando o processo histórico se interrompe, quando a necessidade se associa ao horror e a liberdade ao tédio, a hora é boa pra abrir um bar”. Ou jogar bolinha de gude.