Fernando Henrique Cardoso ressurge na passarela, tira o chapéu para Dilma Rousseff e, elegantemente, saúda a “reforma ministerial do Lula”. Com licença do professor, mas a presidente eleita está se saindo melhor que a encomenda. A mulher “não tem medo de búia de cesto”, como dizem lá em Ponta Grossa.

continua após a publicidade

A expressão não é aqui nenhuma novidade, mas não custa repetir a explicação: “Quando um burro que carrega dois cestos não é experiente, ele se assusta ao passar por um lugar estreito em que os cestos enroscam, fazendo barulho (búia).

Para usar outra expressão “do tipo”, podemos dizer que Dilma Roussef “não tem medo de voz grossa”, ao desafiar os barbudos do PT e declarar que o apedrejamento de mulher no Irã é “medieval”.

O “grito de independência” de Dilma Rousseff saiu no jornal The Washington Post, na entrevista onde a presidente eleita fala de economia internacional e política externa. Sem medo de ser feliz, condenou o apedrejamento e qualquer outro tipo de prática “medieval” contra as mulheres. Como que ensaiando sua própria orquestra, Dilma sinalizou ao público externo e interno que nem todas as posições do governo Lula serão as suas. Especialmente quanto ao medieval governo do Irã.

continua após a publicidade

Sem usar da voz grossa, a nossa presidente de origem búlgara deixou bem claro: “Eu não endosso o apedrejamento. Não concordo com as práticas medievais características que são aplicadas quando se trata de mulheres. Não há nuances e eu não farei nenhuma concessão em relação a isso”.

Tirante a ressurreição da CPMF, da legalização do bingo e da compra de mais um aerolula, aos poucos Dilma Rousseff nos surpreende com o conteúdo de seu “púcaro búlgaro”. Ou seja, de sua “panela búlgara” da qual não conhecemos bem o tempero.

continua após a publicidade

“Púcaro Búlgaro” é nome do fantástico livro de Campos de Carvalho, onde um sujeito chamado chamado Hilário um dia decide fazer uma expedição para conferir com os próprios olhos se a Bulgária de fato existe. Põe um anúncio no jornal procurando voluntários. Tipos estranhíssimos se apresentam: um tal de Pernacchio, que, por ter morado muito tempo ao lado da Torre de Pisa, acabou ficando inclinado também; o Ivo Que Viu a Uva, um descendente do sábio hindu que inventou o zero, sujeito que vive reivindicando os direitos autorais sobre o uso desse número; e Radamés Stepanovicinsky, autodenominado bulgarólogo, que tem um gato na mão.

Este tal de Hilário é um tipo mais ou menos parecido com a própria Dilma Rousseff, caso ela publicasse um anúncio nos jornais procurando voluntários para o seu futuro ministério. Tipos estranhos se apresentariam como sempre: Edison Lobão, Erenice Guerra, José Dirceu, Renan Calheiros, Michel Temer, Carlos Lupi, Gim Argello, Jader Barbalho, Ciro Gomes, Walfrido dos Mares Guia, Silas Rondeau, Hélio Costa e mais uma centena de figurinhas e figurões da base governista.

Numa outra passagem do “Púcaro Búlgaro”, o personagem vai ao psicanalista que o faz deitar num divã, sem o paletó, a gravata e os sapatos. Em seguida, o psicanalista calmamente fecha as cortinas da janela e pergunta:

– Agora vai dizer em voz alta, e sem pensar, tudo que lhe vier à cabeça. Relaxe-se o mais que possível e nada de escrúpulo.
– Escrúpulo. Cabeça. O oceano é azul. Que calor está fazendo. A morte de Danton.

As metamorfoses de Ovídio.

O senhor é uma besta. Com quantos paus se faz uma canoa? Vinte e um, vinte e dois, vinte e três, vinte e quatro. As laranjas da Califórnia são deliciosas. Umbigo. Rapadura. Otorrinolaringologista….

E por aí foi o personagem de Campos de Carvalho, dizendo tudo o que lhe vinha à cabeça. Mais ou menos como já está acontecendo com Dilma Rousseff.