O primo italiano

E assim escreveu o craque (em tudo) Tostão: “Na véspera da final da Copa de 1998, Zagallo disse que a Seleção só perderia para si mesma. Dias atrás, Marin falou que só uma fatalidade tira o título do Brasil. Parreira já tinha dito que a seleção está com a mão na taça. Arnaldo Ribeiro, da ESPN Brasil, acha que o time brasileiro é favoritaço. Alguém já pensou na possibilidade de o Brasil não ganhar a Copa?”.

Por falta de uma opção no momento, podemos responder ao mestre que não. Hoje não pode passar pela nossa cabeça a possibilidade de alguém azedar o piquenique da família Scolari na Granja Comary. Até aqui tudo bem! – dizia o camaradada no meio de uma queda do centésimo andar, num cartum de Millôr Fernandes. Nunca antes neste país uma seleção começa uma Copa do Mundo em tamanho estado de graça, como se estivesse no acenando com V de vitória da janela cor-de-rosa do mundo.

E não é para menos. Podemos discordar do atual corte de cabelo do Neymar, mas apesar dos pesares estamos conformados com a lista de convocados. É o que temos. Na falta de opções no estoque, o que temos de melhor está na prateleira.

Conforme pesquisa DataFolha, 65% dos brasileiros confiam mais em Felipão do que nos seus jogadores. Por que confiamos mais no Felipão do que em nossos craques? – pergunta e responde o cronista Augusto Mafuz: “Porque entende de futebol. É consciente que a decadência interna do futebol brasileiro privou-nos da geração em massa de grandes jogadores. A regra são os jogadores limitados às funções táticas”.

Quem fugia à regra era a seleção de Telê Santana. Na Copa do Mundo de 1982 recebemos em Nova Trento (SC) a visita de um primo italiano. Naquele idos as passagens aéreas internacionais eram tão caras que faziam desses reencontros com as raízes familiares um motivo de muita festa. Uma delas foi no dia 5 de julho, quando o Brasil enfrentaria justamente a Itália e o primo italiano iria conhecer a famosa feijoada brasileira. Com direito a caipirinha e a um baile dos “fuori serie” de Telê Santana na “squadra azurra”. Afinal, a vitória do Brasil era tão líquida e certa quanto a cervejinha bem gelada.

O primo italiano não se mostrou muito encorajado a assistir aquele passeio do Brasil no Estádio Sarriá, em Barcelona. Momentos antes de começar o jogo ele saiu sozinho para passear nas redondezas e só voltou noventa minutos depois, assobiandofaceiro a “Aquarela do Brasil”, o clássico de Ary Barroso:

Ah, este Brasil lindo e trigueiro
É o meu Brasil, brasileiro
Terra de samba e pandeiro
Brasil, Brasil
Pra mim, pra mim

Naquela tarde em que até a luz faltou em Nova Trento, com os três gols de Paolo Rossi o primo italiano lavou de azul a nossa seleção verde-amarela.