“É monstruoso como, hoje em dia, as pessoas vivem dizendo, pelas nossas costas, verdades terríveis e indiscutíveis contra nós”. A frase é de Oscar Wilde, mas pode ser dita por qualquer torcedor atleticano. É uma terrível verdade: para os rubro-negros, as tardes de domingo nunca foram tão tristes quanto nos últimos meses.

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Até pouco tempo, os atleticanos eram torcedores doentes. Agora, além de doentes, são sofredores que vivem pelos cantos se queixando de tantas dores. Nas tardes de domingo, especialmente neste último inverno, doem não apenas os ossos como também os sorrisos sarcásticos daqueles adeptos do Alto da Glória. Os atleticanos não devem temer a própria morte, nem o futuro na segunda divisão. Ora, confrades do tormento, emocionalmente nós rubro-negros já estamos na divisão inferior. Só o que nos faltam são as boas-vindas e o abraço de consolo da torcida paranista.

Pior que as tardes de domingo, quando qualquer solitário foguete vindo da Água Verde é um fio de esperança, são as noites de domingo. Pizza e coca-cola foram feitos um para o outro. O que estraga o apetite não é mais a abertura do Fantástico, o hino à segunda-feira, é por desgraça ligar a televisão justamente no momento do infortúnio.

O dissabor é tanto que atleticano anda cortando até o rabo do cachorro. Isto para chegar em casa e ninguém o receber com a mínima manifestação de júbilo. Com tantos dissabores, agora não é mais possível nem mesmo beber para esquecer. O futebol deixou de ser lazer, agora é obrigação, lamentava o rubro-negro, aborrecido inclusive com a proibição de vender cerveja na Arena da Baixada. Temos obrigação de torcer, mesmo assim, mas passar uma tarde de domingo sem nem mesmo um copo de cerveja é fazer do torcedor um atleta olímpico. Saudades daquelas barraquinhas de cerveja e pão com bife do velho Joaquim Américo, na curva do pinheiro. E argumentava ainda o acabrunhado: americano, atualmente, não serve de exemplo pra ninguém. Mas experimentem proibir a cerveja num jogo de basquete em Chicago. Nos EUA, onde o esporte não é só um negócio dentro do campo, um jogo de basquete tem quatro tempos: um pra comprar a camisa do time, outro para comprar cachorro-quente e os dois seguintes pra comprar cerveja. Jogo de beisebol já é extremamente chato, sem uma cerveja na mão é de dormir na arquibancada.

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No ano que vem, prevêem os entendidos do mercado, na moderna Arena não vamos nos servir nem mesmo de refrigerantes. Os comerciantes que pagam impostos estão no rumo da falência. Já os comerciantes de craques e pangarés vão muito bem, obrigado.

Porque o futebol é lazer, e não uma obrigação, grande parte dos 20.000 atleticanos que compraram ingressos antecipados estão procurando, nas tardes de domingo, algum conforto nos clubes de futebol da Europa. Por ser também rubro-negro, o Milan é o preferido. De minha parte, confesso, me inscrevi na legião estrangeira de torcedores do Sankt Pauli, um pequeno clube de Hamburgo.

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O Sankt Pauli tem torcedores em toda a Europa, e uma bela história. É um caso emblemático na Alemanha pós-nazista. Atualmente na série B alemã, a Zweite Bundesliga, o clube jamais ganhou qualquer campeonato, mas já é considerado um fenômeno cult. Tem tantos admiradores que atualmente edita uma revista de torcida com a maior tiragem do mundo. Seu estádio abriga 21.000 espectadores e está situado num bairro, com o mesmo nome, de baixa renda. O Sankt Pauli, portanto, é um time politicamente de esquerda, com a característica que o tornou amado na Europa: uma sociedade operária que não permite o ingresso ao estádio e não aceita os nazistas, neonazistas, ultranazistas ou racistas. O timinho de bairro que nunca foi campeão é o que se diz na Itália: “St. Pauli è uno stile di vita, come non amarlo?”

Nos últimos meses, para exorcizar as tardes de domingo, torço para o Sankt Pauli desde criancinha.