O gênio dos desejos impossíveis

De tanta violência urbana, de tantos assaltos em seus estabelecimentos comerciais, de tanto tiroteio na vizinhança, de tantos assassinatos no bairro, de tanto descaso com a segurança pública, o camarada vendeu tudo o que tinha em Curitiba e foi passar um ano sabático na Ilha do Mel.

Ano sabático, sabemos, é um longo período de férias que as empresas mais sofisticadas permitem para incentivar funcionários que se mostram abatidos e sem perspectiva. Dessa forma (depois de pensar na vida em Paris, por exemplo), os afortunados voltam bem mais motivados. Pobre chama isso de chutar o pau da barraca, simplesmente, e com isso só perde o emprego.

Motivos para uma temporada na Ilha do Mel o infeliz tinha: proprietário de dois postos de gasolina, duas lojas de conveniências, uma lotérica e uma pequena rede de mercadinhos na região metropolitana, o camarada estava completamente abatido e sem perspectivas, tantos foram os assaltos que os seus negócios sofreram nos últimos anos. Entre mortos e feridos, enfim, tudo levou o camarada a chutar o pau da barraca, vender o patrimônio e, com o dinheiro amealhado, tirar um ano sabático na Ilha do Mel.

Certo dia, durante uma caminhada na praia das Encantadas, o camarada tropeçou numa velha lâmpada. Esfregou-a. Um gênio saltou lá de dentro e começou com aquele blá-blá-blá típico do telemarketing de cartão de crédito, para depois entrar no assunto principal:

– Você libertou-me da lâmpada. Agora esqueça aquela história dos três desejos. Você tem direito a um desejo apenas. Diga o que quer.

O homem pensou por um instante e respondeu:

– Esse meu período sabático aqui na Ilha do Mel está sendo uma maravilha. Apesar da pouca infraestrutura, do lixo que os turistas largam nas praias, da quase insalubridade da água, do saneamento de quinto mundo e outras mazelas das autoridades incompetentes, minha vida está sendo bem mais segura e agradável do que antes. Apesar dos pesares, só não suporto mesmo é navegar até Paranaguá para falar com o gerente do banco. Tenho medo do mar e costumo ficar enjoado na travessia. O meu grande desejo seria uma ponte que ligasse a Ilha do Mel ao continente, para atravessar a Baía de Paranaguá de carro.

O Gênio riu:

– Uma ponte entre a Ilha do Mel e Paranaguá? Impossível! Pense na viabilidade. Mesmo com o Canal da Galheta assim tão rasinho, pense nas vigas de sustentação, quanto concreto armado, quanto aço, quanta mão-de-obra e, o mais impossível: nunca os ecologistas iriam permitir fazer uma ponte de tal natureza. Só para realizar o estudo de impacto ambiental seriam necessários bilhões, além do custo de uma guerra civil. O governo não tem verba nem para construir um trapiche decente, imagine uma ponte desse tamanho. E vamos que construísse: no dia seguinte o preço do pedágio seria o mesmo que uma diária na melhor pousada e, além de tudo, a Polícia Federal iria botar na cadeia os empreiteiros da obra. Não, de maneira nenhuma! A ponte não pode ser! Pense em uma coisa mais razoável.

O camarada compreendeu, tentou outra opção:

– Então meu desejo é voltar para Curitiba, retomar os meus antigos negócios. Com uma condição: desejo trabalhar em paz, dormir à noite, sem o pesadelo de me ver assaltado diariamente.
O Gênio voltou a rir:

– Não faça pedidos impossíveis. Vamos lá, pense numa coisa mais razoável!
O camarada pensou mais um pouco, até chegar a um desejo que lhe pareceu perfeitamente possível:

– Gênio, pelo menos desejaria ver a Arena da Baixada com o teto retrátil funcionando. Seria possível?

– Desejas uma ponte na Ilha do Mel com duas ou quatro pistas?