De tanta violência urbana, de tantos assaltos em seus estabelecimentos comerciais, de tanto tiroteio na vizinhança, de tantos assassinatos num único fim de semana, com tanto descaso com a segurança pública, o camarada vendeu tudo o que tinha em Curitiba e foi passar um ano sabático na Ilha do Mel.

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Motivos para uma temporada na Ilha do Mel o infeliz tinha: proprietário de dois postos de gasolina, duas lojas de conveniências, uma lotérica e uma pequena rede de mercadinhos na região metropolitana, o camarada estava completamente sem perspectivas, tanto foram os assaltos que os seus negócios sofreram nos últimos anos. Entre mortos e feridos, enfim, tudo levou o camarada a chutar o pau da barraca, vender o patrimônio e, com o dinheiro amealhado, viver sossegado na Ilha do Mel.

Certo dia, durante caminhada na Praia das Encantadas, o camarada tropeçou numa velha lâmpada. Esfregou-a. Um gênio saltou lá de dentro e começou com aquele blá-blá-blá, para depois entrar no assunto principal:

– Você libertou-me da lâmpada. Agora esqueça aquela história dos três desejos. Você tem direito a um desejo apenas. Diga o que quer.

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O homem pensou por um instante e respondeu:

– Esse meu período sabático aqui na Ilha do Mel está sendo uma maravilha. Apesar da infraestrutura, do lixo que os turistas largam nas praias, do saneamento de quinto mundo e outras mazelas das autoridades incompetentes, minha vida está sendo bem mais segura e agradável do que antes. Apesar dos pesares, só não suporto mesmo é navegar até Paranaguá para falar com o gerente do banco. Tenho medo do mar, fico enjoado na travessia. O meu grande desejo seria uma ponte que ligasse a Ilha do Mel ao continente, para atravessar a Baía de Paranaguá de carro.

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O gênio riu:

– Uma ponte entre a Ilha do Mel e Paranaguá? Impossível! Pense no assunto. Mesmo com o Canal da Galheta assim tão raso, pense nas vigas de sustentação, quanto concreto armado, quanto aço, quanta mão-de-obra e, o mais impossível: nunca os ecologistas iriam permitir fazer uma ponte de tal natureza. Só para realizar o estudo de impacto ambiental seriam necessários bilhões, além do custo de uma guerra civil. E vamos que eu realizasse: no dia seguinte o preço do pedágio seria o mesmo que uma diária na melhor pousada da ilha. Não, de maneira alguma! Pense numa coisa mais razoável.

O camarada compreendeu, tentou outra opção:

– Então meu desejo é voltar para Curitiba, retomar os meus antigos negócios. Com uma condição: segurança! Segurança pública! Desejo trabalhar em paz, dormir à noite, sem o pesadelo de me ver assaltado diariamente, os funcionários baleados pelos bandidos. É a estatística: só no num fim de semana, a Região Metropolitana de Curitiba tem uma morte por hora. Estamos vivendo numa terra de ninguém.

O gênio voltou a rir:

– Não faça pedidos impossíveis. Vamos lá, pense em alguma coisa mais razoável!

Novamente o camarada compreendeu, pensou mais um pouco, até chegar a um desejo que lhe pareceu possível:

– Gênio, vamos trocar o secretário da Segurança!

– Desejas uma ponte com duas ou quatro pistas?