Revirando o baú da cultura de almanaque, leio que o colarinho branco era ferramenta de trabalho dos vendedores. Tanto, que uma respeitável firma de Wall Street, a Wallace, Petticoat & Lane, tinha um manual de instruções onde recomendava aos seus vendedores que, antes de vestirem a camisa de manhã, submetessem o colarinho à prova da janela. Se houvesse dúvida quanto ao estado dele, que jogassem a camisa na roupa suja.

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Conforme o manual, quando o vendedor de qualquer coisa entra num escritório ou residência, o olhar do “prospective client” vai primeiro para o colarinho. O sapato pode estar furado na sola (o cliente não vê), a calça pode estar puída no fundilho (o vendedor entra de frente), mas o colarinho tem que estar impecável em qualquer circunstância.

O colarinho já teve os seus tempos de glória, principalmente quando ele era descartável para ser mudado diariamente. Tinha até um palmo de largura e se espalhava por cima do gibão, e coitada da lavadeira que não o devolvesse engomado, alvo e estalando de bonito.

No Brasil o colarinho era sinônimo de autoridade. Pelo colarinho media-se o prestígio do fulano. E tinha sicrano que nem mesmo levava o colarinho no pescoço, guardava no bolso como se fosse um documento.

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– Sabe com que está falando?

E dá-lhe um colarinhaço, digo, um carteiraço!

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De uns bons anos para cá, o colarinho branco entrou em decadência. Começou quando explodiram na imprensa os primeiros crimes do colarinho branco e caiu de moda, apesar de nenhum colarinho branco ter sido visto no xadrez. Muito pelo contrário, livres e soltos, substituíram a parte que envolve o pescoço pelo colarinho xadrez com gravata quadriculada. Um horror.

Politicamente, podemos dizer que a base do governo Fernando Henrique Cardoso era caracterizada pelo colarinho branco. Do Lula em diante, a predominância é do colarinho xadrez com gravata retangular. Ou seja, mudam os colarinhos mas a laia continua a mesma.

Assim estigmatizados, coitados dos coletes. Perderam tanto prestígio que até uma plebeia camiseta de gola careca ganhou o direito de escoltar o paletó. Pior que o colarinho, só mesmo o que aconteceu com o colete. São duas espécies em extinção.   

Dia desses saí na rua desprevenido e entrei num shopping para comprar um colete. Na loja de roupas de grife me atendeu um jovem descolado e com sotaque de novela. Ao todo sorrisos, fui logo perguntando:

– Vocês têm colete?

E o vendedor me respondeu com meio sorriso:

– Colete salva-vidas?