O castelo do Guimarães

Com um povo servil, quem tem um olho é rei, manda fazer um castelo e engorda às custas de seus bobos da corte que lhe fornecem votos e dízimos. O deputado Edmar Moreira é a caricatura mais bem acabada do castelo como exemplo de poder, vassalagem, exploração.

O castelão Edmar Moreira é acusado de omitir de sua declaração de bens um castelo em Minas Gerais, que está à venda por R$ 25 milhões.
O feudo, na região da Zona da Mata de Minas Gerais, tem 36 suítes e só é diferente de outros castelos espalhados pelo Brasil na arquitetura, que de tão horrorosa ganhou o Jornal Nacional. O castelo de José Sarney, senhor feudal do Maranhão, não tem 36 suítes, mas possui um número tão grande de servos que o estado mais atrasado do Brasil mereceu uma reportagem especial (“Onde dinossauros ainda vagam”) da revista britânica The Economist.

No imaginário popular, são próprios do castelão a corrupção, a luxúria e os delírios de riqueza. Aqui no Paraná, o castelo como totem da roubalheira é o Castelo do Lupion. Governador do Estado em 1947/1951 e 1956/1961, Moysés Lupion ficou para o anedotário histórico como um dos políticos mais corruptos do Brasil, apesar de ter sido absolvido nos vários processos onde foi acusado de grilar terras e revender áreas devolutas cultivadas por posseiros.

Se Moiyés Lupion fez por merecer a lenda, existe literatura suficiente para julgar o senhor feudal que, conta-se, chegou a vender até uma praça pública. Corrupto ou não (os descendentes provam que não), o que se pretende aqui é corrigir uma injustiça histórica, quando se denomina o magnífico castelo do Batel como exemplo folclórico da era Lupion. O castelo iniciado em meados de 1924 e concluído em meados de 1928 merece o nome de seu construtor, o cafeicultor Luís Guimarães.

O Castelo do Guimarães precisa ser regenerado. Não um ícone de Lupion, mas no sentido de representar o mais vistoso exemplo de um período vigoroso da nossa história econômica que só ainda existe graças ao arquiteto Sérgio Todeschini Alves.

O castelo do cafeicultor Luís Guimarães ficou um longo tempo dentro dos tribunais. Depois que Lupion comprou a mansão por três milhões de cruzeiros (três mil contos de réis), a propriedade passou de forma nebulosa para os especuladores William Mussi e J. Ramon, que tentaram, em 1974, impedir o tombamento do imóvel pelo Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico, então comandado por Todeschini Alves. Na mão de bucaneiros, aquela valiosa área no bairro chique do Batel seria um tesouro do Caribe. Sérgio Todeschini contestou a tese levantada pelos advogados de William Mussi de que o Castelo do Guimarães, construído nos anos 20 com projeto do arquiteto Eduardo Fernando Chaves, não representa uma arquitetura nacional: “É sabido que o Brasil foi colonizado por portugueses no início. Mas é verdade também que outros povos do mundo vieram para cá, na ânsia de encontrarem o novo mundo e com sua cultura começarem a nos influenciar. Devemos também prestar uma homenagem a outros povos do mundo que com parcelas da sua cultura estão ainda formando o modelo brasileiro”.

Inspirado nos castelos franceses do Vale do Loire, alguns anos depois o sonho do cafeicultor Luís Guimarães voltou às mãos da família Lupion, numa batalha judicial que dá uma curiosa novela de mil e uma falcatruas.

Pelo que se deduz de suas memórias, Luís Guimarães era um camarada formidável. Na festa de inauguração que sacudiu a cidade, com uma orquestra de muitos maestros, o cafeicultor convidou exclusivamente os amigos, das pessoas mais modestas às mais ilustres: “O mais modesto de meus convidados surpreendeu-me, comparecendo com a esposa e filhos impecavelmente vestidos, ele de casaca e luvas de pelica brancas. Abracei-o emocionado. Compareceram mais de 300 convidados, nenhuma pessoa que não fosse amiga. Houve descontentes, que se julgavam com direito a ser convidados por sua projeção social ou financeira, mas não o foram”.