Há quem atribua a origem da surrada expressão de que “tudo vai terminar em pizza” ao caráter “mezzo” preguiçoso, “mezzo” cordial do brasileiro. Por maior e mais sério que seja um entrevero, as partes acabam abraçadas, chorando um nos braços do outro.
Segundo Jaguara, o Animador de Velórios dos Campos Gerais, quem mais conhecia o caráter nacional era o poeta e memorialista Pedro Nava: “No Brasil, se defunto não apodrecesse, aqui ninguém enterraria ninguém”.
E para ilustrar a teoria de Pedro Nava, o Jaguara costuma interpretar a seguinte cena de uma família em torno do falecido.
– Oh gente, quando é que vamos enterrar o vovô? – perguntam os netos à mesa do café.
– Hoje não, que está chovendo. Bota ele no sótão, vamos deixar para amanhã! – responde o tio mais velho.
O cadáver do vovô no sótão, no dia seguinte a netinha mais nova pergunta no café da manhã:
– Gente… e o vovô? Quando é que o vovô será enterrado?
Faz-se um silêncio sepulcral na mesa e o chefe da casa determina:
– Não podemos estragar o fim de semana de ninguém. Vamos deixar os procedimentos pra segunda-feira.
Os demais se entreolham com peninha do vovô, coitado, que jaz no sótão sobre uma mesa de passar roupa.
Entra a semana, o cadáver do vovô no sótão, os netos voltam ao tenebroso assunto, antes do jantar:
– Gente… e o vovô? Quando é que vamos enterrar o vovô?
O chefe da família, com ar irritado, passa uma descompostura geral:
– No Brasil, defunto não apodrece! Olhem bem pra minha cara pra ver se estou preocupado com o enterro do vovô! Está enterrado o assunto… e vamos todos à mesa que hoje tem pizza!
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No final da função, o Animador de Velórios declama um poema de Pedro Nava que poderia ser uma ode aos Mensaleiros insepultos no sótão do Lula.
Meus amigos, tenham pena,/ senão do morto, ao menos / Dos dois sapatos do morto! / Dos seus incríveis, patéticos / Sapatos pretos de verniz./ Olhem bem esses sapatos, / E olhai os vossos também.