O abençoado

Mais um ministro com a navalha no pescoço e o presidente, antes de nomear um ministro, ainda não aprendeu a ouvir as paredes. Sim, pelo visto, as paredes de Brasília são bem mais informadas que o próprio Lula.

Exército, Marinha e Aeronáutica, as três armas possuem um serviço secreto. O próprio presidente, ao alcance do seu telefone, tem a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e, mesmo assim, os vexames se sucedem. ?Está na cara!? – diria Cesare Lombroso – os defenestrados são figurinhas carimbadas e – como se existisse no governo uma Secretaria do Silêncio – nenhuma alma piedosa se apresenta ao presidente para lhe dar um bom conselho, à maneira de Chico Buarque de Holanda: ?Com esse, vai dar merda!?

Um ministro de Estado não precisa ser um ?iluminado?, como foi Sidarta Gautama, o Buda, cujo sobrenome veio a dar origem ao nome da construtora que era usada como alavanca para arrombar os cofres públicos. Zuleido Soares (Charles Bronson) Veras, que fazia altos negócios no fio do bigode, se dizia baiano e budista desde criancinha. Lorota, ele nasceu na Paraíba e é budista, sim, mas do pau oco.

Todas as paredes de Brasília conhecem a estrumeira onde nasceu o empresário Zuleido Soares Veras. No maior país católico do mundo, poucos conhecem a origem de Buda, ou têm acesso ao Google: Siddhartha Gautama foi um príncipe que viveu por volta de 563 a.C. 483 a.C., no reino de Sakya – que hoje em dia seria parte da fronteira do Nepal com a Índia. Siddhartha é uma junção do sânscrito Siddhi (realização, completude, sucesso, liquidação de um débito) e Artha (alvo, propósito, meta). Pode ser traduzido como ?aquele cujos objetivos são alcançados? ou ainda ?aquele que cumpriu a meta a que se propôs?. Gautama era seu nome de família, que significa ?a melhor vaca?.

Não se escolhe um ministro como se escolhe a melhor vaca. Para se escolher a melhor vaca, existem critério técnicos e a uma escolha equivocada causa um razoável prejuízo no próprio bolso do comprador. Na escolha de um ministro, fica evidente, não existe critério e o imenso prejuízo quem paga é o meu, o seu, o nosso bolso.

Na falta de critérios para escolher um ministro, o presidente Lula poderia buscar inspiração em Sidarta Gautama, o Buda, antes de assinar a nomeação do escolhido. Para obter a revelação de um bom ministro, Lula devia mandar o indicado subir na montanha e sentar-se sob uma frondosa árvore por sete dias e sete noites – assim como fez Sidarta Gautama.

Com o corpo acomodado na posição de lótus, o pretendente seria então testado em suas convicções de bem servir ao povo brasileiro. Imóvel, pássaros fariam titica na sua cabeça, as aranhas teceriam teias de seus cabelos, as ervas cresceriam entre suas pernas e braços.

Em seguida, mulheres lindas e oferecidas viriam com propostas de suborno embaixo das saias. Homens simpáticos e risonhos se aproximariam com violas, canções, comidas, contas bancárias no exterior, vinhos raros, charutos Cohibas, carros de luxo e outros mimos, tudo em troca de futuras fraudes nas licitações públicos.

Depois de sete dias e sete noite de tentações, assim assediado pela luxúria, caso o candidato a ministro descesse da montanha puro de corpo e alma, com os pássaros cantando cantigas de louvor à honestidade, o presidente Lula poderia, enfim, lavar os pés do abençoado.