Nosso velho amigo Sol

Neste domingo, a senhorita Primavera vai acordar mais tarde, adiantar o relógio e se despedir do vizinho Inverno que está de malas prontas para a sua costumeira temporada na Europa. Por sua vez, o nosso tímido Verão convidou a amada Primavera para um passeio no parque no final da tarde, com o propósito de exibir seu novo relógio. Primavera e Verão foram feitos um para o outro, pena que aqui em Curitiba os dois nunca acertaram seus ponteiros. Tudo por causa do Sol, o velho patriarca, que prefere ver a Primavera de mãos dadas com o Inverno.   

O curitibano pode ser considerado frio, avesso ao calor humano. Em contrapartida, sua admiração pelo Sol é calorosa. Nessa época, quando por força da autoridade máxima nos submetemos aos horários do Verão, não existe um Sol em Curitiba. São vários. Cada cidade tem o seu próprio astro, com suas próprias manias. No Brasil, a família Sol é grande.

Na Bahia, o Sol é baiano. Tem a rotina copiada de Dorival Caymmi: não se põe, vem deitado numa rede e lá se deixa de papo pro ar. E ai da nuvenzinha metida que ousar lhe tirar do sossego. Transforma a atrevida em água de coco. O Sol paulista é poderoso. Tem uma vasta jurisdição, atende uma megalópole, daí que é assim cansado e pouco dá expediente no Vale do Anhangabaú. Em Santa Catarina, em cada praia um Sol. Em Balneário Camboriú o Sol nasce para todos, mas o pôr-do-sol é só para os que têm apartamento de cobertura. No Rio Grande do Sul, a luz nasce na casa de Luis Fernando Verissimo e se põe nas águas do Rio Guaíba. Na Argentina, o Sol não brilha, é ofuscado pelo astro rei local, o próprio ego.

O Sol do Rio de Janeiro é um fenômeno da natureza. Nas águas da Baía de Guanabara, desfila em passarela. Enquanto no resto do Brasil a família Sol nasce no mar, no Arpoador ele deita no mar, com direito a plateia, champanhe e aplausos. Sem lenço, sem documento, o Sol carioca é uma unanimidade.

Um dos primeiros a estudar o Sol curitibano, bem de longe, foi o escritor Manoel Carlos Karam.

 Perguntava ele: “Existe sol em Curitiba? A cidade sem mar é obrigatoriamente uma cidade sem sol? A cidade com ano de duas estações – inverno e rodoferroviária – não tem direito a sol? Não há sol no inverno, mas há sol na rodoferroviária. Um enorme sol pintado na traseira dos ônibus da Graciosa, a empresa que tem linhas de Curitiba para o litoral. O curitibano leva um sol nas costas ao fazer o trajeto Curitiba-Atlântico”.

São poucos os que conheceram pessoalmente o Sol. Entre eles Manoel Carlos Karam, quando escrevia e dirigia peças de teatro, e este que agora vos escreve, quando fazia cenários no Teatro Guaíra. Naqueles idos do final do século passado, um dos funcionários da Fundação Teatro Guaíra tinha o nome de Sol Rodrigues.

Conhecemos o Sol em carne e osso. Era um bom e generoso amigo.