Em um ano, Tio Sam perdeu US$ 7,3 trilhões. Em conseqüência, George W. Bush et caterva estão com a corda no pescoço e o mundo globalizado no fio da navalha. Que Deus nos proteja, o papa Bento XVI nos ilumine e, se possível, que o Vaticano nos oriente como salvar nossas minguadas economias.

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Junto com a ajuda divina, o mundo precisa ouvir as palavras do pastor e os ensinamentos econômicos de seus cardeais. Para Bento XVI, o desaparecimento de trilhões de dólares por causa da crise mostra que a busca da riqueza não significa “nada” e que as pessoas deveriam basear as suas vidas na palavra de Deus. O papa alemão usou a atual crise financeira mundial como exemplo para afirmar que aqueles que buscam “sucesso, carreira ou dinheiro estão construindo sobre areia”.

Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. Enquanto as bolsas do planeta vêm desmoronar seus castelos de areia, o Vaticano vai muito bem, obrigado. Conforme reportagem de capa da revista italiana Espresso, o papa tem os poderes de Midas. Mesmo sem o carisma de João Paulo II, Bento XVI não está lotando apenas a Praça de São Pedro. Com os tesoureiros de batina carregando o andor, o alemão está lotando também o caixa do Vaticano. Com o título Que tesouro de papa, a revista revela que as doações dos fiéis cresceram 58% em 2006 em relação ao ano anterior, chegando a US$ 101,9 milhões (cerca de R$ 193,6 milhões).

O mundo globalizado está na UTI, mas Bento XVI administra uma igreja que financeiramente explode de saúde. Na quebra da bolsa, em 29 de outubro de 1929, quando milhares de bancos, indústrias e empresas foram à falência, o sumo pontífice do Vaticano era Pio XI, nascido Ambrogio Damiano Achille Ratti,
em Milão.

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Quem leu o livro O fio da navalha, de Somerset Maughan, se recorda: este Pio XI e seus tesoureiros deviam saber muito mais do que se passava na Bolsa de Nova York do que Franklin Delano Roosevelt.

Para ativar a memória, uma ligeira sinopse de O fio da Navalha: Larry Darrel conhece a morte na Primeira Guerra na Europa e volta em estado de choque. Larga a vida burguesa de Chicago e rompe seu noivado com a bela Isabel Bradley. Como muitos jovens de sua geração, Darrell vai passar uma temporada de aprendizado existencial em Paris, perambulando pelos cafés e lendo livros sobre a Índia e o Nepal, para onde viaja. Anos mais tarde, de volta a Paris, Darrell reencontra Isabel com um marido falido, que haviam deixado os EUA depois da crise financeira de 1929.

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Dos personagens de Somerset Maughan, que também se faz personagem da trama, o mais fascinante é o tio de Isabel, o bon vivant Elliott Templeton: “Ele comprava os acessórios de toalete em Charvet, mas seus ternos, chapéus e sapatos eram de Londres. Tinha em Paris um apartamento na Rive Gauche da elegante Rue St. Guillaume”.

Negociante de artes, Elliot Templeton era rico. Comparado com o sogro da sobrinha Isabel, porém, era um pobretão. Mas um pobretão muito refinado e católico, com amigos cardeais no Vaticano. Semanas antes da quebra da bolsa, Templeton telefonou para Chicago e, para espanto de todos, ordenou aos seus operadores de que vendessem todas as suas ações na bolsa e transformassem os dólares imediatamente em ouro.

A bolsa quebrou, o sogro da sobrinha se suicidou, os amigos americanos em Paris retornaram sem um tostão no bolso para Nova York e Eliott Templeton, que já tinha um belo apartamento na Rive Gauche, foi morar numa mansão da Riviera Francesa, 100 vezes mais milionário.

Templeton era incrivelmente esnobe. Quando Somerset Maughan lhe perguntou, entre ostras e champagne, como havia conseguido resgatar sua fortuna antes do furacão, o esnobe sem a menor vergonha contou que seus poderosos amigos do Vaticano eram iluminados por Deus. Os tesoureiros de Pio XI o aconselharam a vender as ações em Chicago com urgência e comprar ouro, muito ouro. Temente a Deus, Elliott Templeton obedeceu.