Em Curitiba a mania de organização e hábito de ver tudo nos seus devidos lugares chega a ser um vício. O arranjo natural da cidade é um exemplo dessa cisma. Curitiba chegou ao ponto de ter, num mesmo quarteirão, seis emissoras de rádio.

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Não se tem notícia de que em outra cidade, sem um plano deliberado, uma área de mais ou menos 1.500 metros quadrados tenha sediado tantas rádios. Marechal Deodoro/Barão do Rio Branco/José Loureiro/Monsenhor Celso, o quadrilátero ficou famoso por ter abrigado as sedes de seis emissoras.

A observação não é de um urbanista ou historiador. Veio de um dos maiores nomes do rádio brasileiro, o falecido Jair Brito. A história do rádio no Paraná passa por esse radialista que, por felicidade nossa, começou sua carreira exatamente naquela quadra dedicada aos caros ouvintes.

Por ter tido o privilégio de trabalhar 11 anos no pedaço extraordinário do rádio curitibano, Jair Brito tinha o mapa na memória: na Barão do Rio Branco, a pioneira foi a Rádio Clube Paranaense, no início dos anos 1940. Depois foi a vez da Rádio Guairacá, em 1947. A primeira, quase na esquina das ruas Marechal Deodoro com Barão do Rio Branco, nº 145, e a segunda, na esquina dessa rua com a Rua José Loureiro, nº 167.

Na mesma Rua Barão do Rio Branco, ao lado esquerdo da Rádio Clube, surgiram as rádios Tingui e Cultura, uma ao lado da outra. No andar térreo da Clube funcionava a loja Santos & Irmão e, no andar térreo da Guairacá, a loja Hermes Macedo. E perto ficava o bar do gordo Abdo, o único naquele pedaço de mais ou menos 1.500 metros.

Em 1955, a Rádio Colombo foi inaugurada no edifício Pugsley, situado na Rua Monsenhor Celso, nº 211. Três anos mais tarde, a Rádio Ouro Verde se transferiu para o mesmo endereço da Colombo. Em 1959, a Ouro Verde mudou novamente de endereço: para a Rua José Loureiro, 372.

E assim completou-se o quadro de meia dúzia de estações de rádio no quarteirão que ficou famoso no Brasil.

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O reverso do quarteirão das ondas hertzianas de Curitiba encontrava-se em Palmas, no sudoeste do Paraná e uma das cidades mais frias do Brasil, conforme nos conta o fotógrafo Maringas Maciel:

“Lá na Palmas da minha infância existia o Darcy da Rádio. Ele era o faz tudo da Rádio Clube de Palmas. Apresentava vários programas, colocava discos pra tocar, abria e fechava a rádio; só não era o dono porque a rádio fazia parte do Sistema Católico de Rádios. Dentre os programas que o Darcy apresentava, tinha “O Entardecer no Sertão”, que como o nome afirmava, começava logo após a ‘Hora do Angelus’. 

Um belo dia o Darcy levou dois trovadores da região para cantar no programa; apresentou os artistas e eles começaram a trovar, ao vivo, na Rádio Clube de Palmas. Tudo ia bem até que lá pelas tantas, no meio das trovas, um chamou o outro (rimando) de “alemão do cu vermeio” e o outro respondeu no mesmo tom, com o nível baixando cada vez mais e descambando num festival de xingamentos nunca antes ouvidos nas ondas hertzianas do rádio. No meio da coisa, o Darcy desligou os transmissores e a rádio saiu do ar por alguns minutos. Quando voltou, ouviu-se a voz contida do Darcy:

– Prezados ouvintes, gostaria de pedir desculpas. Esta é uma rádio cristã, uma rádio católica, e este é um programa familiar. A gente tenta dar chance pros artistas locais, pro pessoal da terra vir apresentar suas músicas, e esses “fiadasputa” vem aqui na rádio dizer palavrão!

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