Milhões de propina, 10% ao garçom e um troco ao carcereiro

Um pouco antes do Natal, dizia aqui na página dois que os predadores da Petrobrás deviam estar magoados com a cidade, pois até então não haviam recebido a visita de nenhum curitibano e, pelo que se sabia até então, ainda não haviam provado as delícias da boa mesa curitibana. Pressupunha-se que os tubarões detidos na Polícia Federal em Santa Cândida, os bacanas da OAS, Camargo Corrêa e Mendes Júnior e até mesmo o doleiro Alberto Youssef não teriam sido apresentados à Cantina do Délio Canabrava, ao Madero do Júnior Durski e ao Paulinho do Don Max, que esta semana comemora 19 anos na Rua Tenente Max Wolf Filho, na Água Verde.

No atacado, somos todos críticos da corrupção. No varejo nem tanto. É o lado cinzento da hipocrisia. Certos desvios de conduta são perfeitamente palatáveis no cotidiano. Os pequenos delitos dentro da carceragem da Polícia Federal, por exemplo, ou a manha de como pedir uma pizza no domingo à noite, uma ponta de costela no almoço de domingo, até quem sabe a visita de uma meiga massagista para aliviar as tensões dos interrogatórios.

Como também delatou o ex-diretor de abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, em depoimento ao Ministério Público, ele e outros detidos usaram um aparelho celular para fazer ligações de dentro das celas, truque do mágico Alberto Youssef. Sendo o único dos presos a contar com recursos não contabilizados, o doleiro pagava com dinheiro em espécie por refeições pedidas por carcereiros para o grupo de detidos. “Certa vez foi entregue costela”, consta no depoimento. Costa disse ainda que um carcereiro identificado como “Benites” chegou a solicitar doações para um asilo. Após esse pedido, uma das filhas do delator teria feito então dois depósitos nos valores de R$ 1 mil e R$ 2 mil para uma conta bancária fornecida por Benites. Outro filho do ex-diretor também teria entregado pacotes de fraldas geriátricas ao carcereiro.

A generosidade dos carcereiros da Polícia Federal só confirma o que já se disse aqui. Com tantos amigos em Curitiba, desde os bons tempos do Banestado, o “brimo” Youssef não iria ficar desassistido. É por essas e outras que os adventícios devem aprender de uma vez por todas: Curitiba não visita, recebe! Exemplo disso se passou no século passado, quando a cidade recebeu com fogos e festas três dos maiores astros da época: Cauby Peixoto, Ivon Curi e Carlos Galhardo. Depois do espetáculo, os anfitriões foram convidados para jantar no bar e restaurante Cinelândia (rua Ermelino de Leão, embaixo do Edifício Tijucas), onde os cantores do rádio se sentiram como se estivessem na própria casa. Inclusive na própria cozinha.

Depois de trocar receitas à mesa, na segunda batida de limão as visitas não se fizeram de rogadas e invadiram a cozinha: Carlos Galhardo fez espetinhos de tartaruga, Ivon Curi preparou um estranhíssimo jacaré ao vinho tinto e o Cauby Peixoto, mais delicado, montou uma salada mista. Foi uma festa! No final da noite, Ivon Curi se despediu com um beijo na bochecha do garçom Ligeirinho: “A gente não imaginava ser tão bem recebido em Curitiba. Nos sentimos em casa!”.

Em Curitiba o restaurante é uma extensão da nossa casa. O que os carcereiros da Polícia Federal fizeram, apesar de ilegal, foi um ato civilizado de bem receber os forasteiros. Se eles não agissem assim, a fina flor da corrupção não poderia justificar a delação premiada com o argumento de que, muito pior do que passar cem anos no presídio da Papuda, seria passar um ano em Curitiba sem provar o frango com polenta de Santa Felicidade.