O planejamento urbano de Curitiba vem de longe. Do início do século passado, pelo menos. Hoje a cidade tem áreas urbanas dedicadas a indústria, comércio e lazer. Lá pelos idos de 1927, no Bigorrilho, tínhamos o Mato dos Enforcados.

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Antiga passagem das tropas do Caminho do Viamão, local de pousada dos tropeiros, o Bigorrilho era formado de chácaras com as casas de madeira bordadas de lambrequins. Com campinhos e barrocas, lavouras e criações, os matos do Bigorrilho eram cortados por riachos e carreiros. Os bosques, infestados de aves e bichos, inspiravam medo nos meninos passarinheiros, sempre com seus estilingues no pescoço e cabelos escovinhas.

Um desses bosques do Bigorrilho era o Mato dos Enforcados. Cercado de mistérios e crendices, o Mato dos Enforcados começava pouco depois da Alameda Augusto Stellfeld, onde hoje é o Hospital Evangélico, e terminava junto à Saldanha Marinho. Da Bruno Filgueira se estendia em direção à Rua Francisco Rocha, cortado por um riacho. Junto, ficava o Campo do Caxias, onde os colonos deixavam seus animais para pastar: na hora de recolher as vaquinhas, andavam meio no escuro por entre carreiros, por vezes batiam com a testa nos sapatos de alguém dependurado em uma árvore.

Para ir à escola, as meninas passavam com medo, alertadas sobre os horrores do bosque. Os meninos só passavam por ali armados de canivetes, estilingues e graúdas pelotas de barro.

De onde surgiu a vocação daquele zoneamento urbano pouco se sabe, os motivos permanecem obscuros. Talvez em função das origens étnicas de Curitiba, com seus polacos, ucranianos, austríacos, alemães e italianos. Quem estiver familiarizado com a cultura da Europa Ocidental, principalmente, reconhecerá no imigrante a sua melancolia introspectiva, a propensão para a depressão, o alcoolismo e elevadas taxas de suicídio.

Naqueles tempos, presume-se, os índices de suicídio em Curitiba deviam ser calculados pelo número de sapatos pendurados no Mato dos Enforcados. Atualmente esses números não chegam ao público, sobretudo porque os jornais têm por norma não registrar suicídios. A não ser quando os fatos são por demais notórios, correlatos a outros casos policiais.

O que se sabe perfeitamente bem é que no Bigorrilho o Mato dos Enforcados não existe mais, foi substituído por uma selva de asfalto e cimento. Enforcados, porém, ainda são muitos: agora pendurados no cartão de crédito.

O sinistro nó no pescoço dos brasileiros que Dilma Rousseff pretende afrouxar, com a queda dos juros do cartão. A presidente já pediu estudos de como realizar esse milagre que só mesmo pode acontecer com muita reza na Igreja dos Passarinhos, aqui no Bigorrilho.

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