Liturgia do chimarrão

De conclave, cabeça de juiz, barriga de grávida e bolsa de mulher, dizem os vaticanistas mais tradicionais, a gente nunca pode prever o que vai sair de dentro. Num momento delicado com este para a Igreja Católica – principalmente com a abdicação de Bento XVI -, até a direção do vento será de suma importância para definir o destino do Vaticano: se soprar para a esquerda, teremos um papa progressista. Se soprar para a direita, a ordem é trocar seis por meia dúzia.

Da missa, ainda não sabemos a metade: se a fumaça é preta, como foi ontem, não teremos papa. Se for branca, “habemus papam”. Caso a fumaça sair cor-de-rosa, é sinal de que certas questões mais delicadas estão sendo discutidas e a conversa vai longe. E se da chaminé de São Pedro saírem algumas labaredas, podem escrever: o papa se chama Odilo Scherer, é gaúcho e já acenderam o fogo para um churrasco.

Se for eleito, como os brasileiros esperam, na sequência teremos outra disputa em torno do novo pontífice: afinal, Odilo Scherer é gaúcho ou paranaense?

– Mas bah, tchê; o homem nasceu em Cerro Largo, aqui no Rio Grande do Sul! É tão nosso quanto o chimarrão!

– Vocês é que pensam que o papa é gaúcho – vai protestar o paranaense. Se não sabem fiquem sabendo: o chimarrão é natural do Paraná e foi levado ao Rio Grande pelos tropeiros de Sorocaba! É quase o mesmo caso do papa: só é gaúcho de batismo.

O argumento paranaense é forte: o cardeal Scherer tem uma longa história no oeste do Paraná. Toda a sua infância foi vivida em Toledo, onde a família foi morar em 1951. A família Scherer já é tão paranaense quanto o porco no rolete, tchê! O menino Otto – que depois mudou o nome para Odilo – completou três anos de idade uma semana após a chegada ao distrito de Dois Irmãos. Foi um dos primeiros alunos do pequeno seminário de Toledo, em 1962, e depois de alguns anos de estudo em Curitiba retornou para o Oeste do Paraná e ingressou no seminário de Cascavel.

Caso o vento da fumaça branca sopre para o lado do cardeal Scherer, considerado um tradicionalista, pela primeira vez poderemos ver um papa de botas, poncho e bombacha. Tem precedente: o motivo pelo qual os papas se vestem de branco vem de 1566, quando foi eleito Pio V. Dominicano, ele não abriu mão de manter a veste branca de sua ordem. A moda papal, portanto, pode ser renovada. Para a festa dos CTGs (Centro de Tradição Gaúcha) desse Brasil afora, o papa metade gaúcho, metade paranaense, pode perfeitamente instaurar no Vaticano a liturgia do chimarrão.