Leitão dos deuses lusitanos

Se existe algo parecido com Santa Felicidade no mundo é a região da Bairrada, em Portugal. Ao entrar na cidade de Mealhada, sede dos premiados vinhos Messias, a semelhança com o nosso bairro italiano começa no enfileirado de restaurantes especializados no “leitão à Bairrada”, o prato escolhido como uma das 7 Maravilhas da Gastronomia de Portugal.

Das tantas casas com o leitãozinho no espeto na fachada, a mais tradicional e prestigiada da região se chama muito justamente “Rei dos Leitões”, fundada em 1947 por Maria Olímpia Ferreira. Foi nesse complexo gastronômico que acompanhamos o passo-a-passo de seis leitõezinhos à mesa. Acompanhados por um veterinário, os leitões são insensibilizados com choque elétrico para depois se proceder o abate. Da raspagem dos pelos à retirada das tripas, passando pelos temperos e pelos cinco fornos da linha de produção num anexo ao restaurante, os bacorinhos são servidos em apenas duas horas. Com capacidade para cinco leitões em cada forno, o restaurante assa em média 25 leitões por dia. 

A receita, conforme nos detalhou Licínia Ferreira, filha da fundadora, é a mesma desde sempre e não requer maiores mágicas além do tempero caseiro e duas horas de forno na boa lenha: limpo e bem seco, enfia-se o leitão de seis (6) quilos num espeto (do ânus à boca) e barra-se por dentro com uma mistura de banha de porco, alho pisado (amassado), sal (não em excesso) e pimenta, ficando tipo “papa” para depois cozinhar dentro do leitão, de onde sairá o molho servido à mesa. Cose-se o porco com agulha e fio enquanto se aquece o forno de cozer pão. Com o leitão no forno, o tempo de cozedura é de duas horas.

No procedimento da Bairrada, o molho não escorre do leitão durante a assadura. Será retirado só no final do assamento. O que escorre serve para temperar a “cabidela de leitão”, prato também tradicional da região e da casa.

Além da simplicidade do tempero, o Rei dos Leitões guarda mais algumas tradições na escolha: o leitão deve ser servido com batata cozida na casca, fatias de laranjas doces e, para os fluidos do espírito, o vinho espumante Messias é um sagrado direito dessa maravilha da Bairrada.