Invernos de amor e truco

Naqueles rotineiros invernos de menos cinco graus, quando a neve era tão pontual quanto o carroção do leiteiro, Rosinha e Stanislaw formavam um casal de dar inveja. Para os dois não existia o que hoje chamam de sensação térmica. Sensação térmica elevada tinha os vizinhos, ao esticar o pescoço para melhor ouvir os arrulhos que vinham da casa daqueles dois pombinhos.

Rosinha e Stanislaw (Stacho, para os íntimos) não marcavam hora para o amor. Mesmo diante das visitas, os pombinhos tinham senha para a sem-vergonhice:

– Truco, Stacho!

– Truco, Rosinha!

Para os dois, truco era a senha para se enfiar embaixo das cobertas. O código do amor. Quando as visitas ouviam… TRUCO! – os amigos polacos respondiam “dobry wieczór (boa-noite) e tratavam de ir embora. Ir embora vírgula, faziam de conta que iam para casa, pois se botavam embaixo da janela dos dois para ouvir a “barrrrulheira” que vinha da cama de mola.

Stacho e Rosinha tinham dias de sim (tak) e dias de não (nie). Os dias de não eram dias de entrevero, mal se encaravam, dispensavam intimidades.

Certo dia de não, Stacho estava amuado na soleira da porta, quando Rosinha se aproximou, bem manhosa e pedinte:

– Truco! – disse Rosinha.

– Nie! (não) – respondeu Stacho, sem ir pro jogo. Nem mais uma palavra, nem mais um gesto, nem um menor olhar de promessa. Assim, Rosinha foi colando o corpo no fingido. Enlaçou um pé no pé do Stcaho, espremeu a coxa na coxa, molhou com os lábios o pescoço do amuado.

Quando desceu a mão pelo barrigão do Stacho, sentiu no volume entre as pernas do zangado que o jogo não estava perdido:

– Stacho, vai correr com um jogo desses?

Rosinha nunca perdeu uma partida. Mesmo quando diziam no rádio para tomar os devidos cuidados com a geada negra, antes de dormir cedo para acordar cedo Rosinha não deixava de perguntar:

– Usando eu hoje de noite, marido?

– Nie! (não)

– Então eu nem lavando os pé pra dormir!

– Dobry wieczór! (boa-noite)