Unanimidade é uma palavra que não temos no dicionário curitibano. Consenso é bastante usada no sentido antônimo, reprovação ou desacordo. Consonância temos, quando nos perguntam qual a melhor época para visitar Curitiba: no verão, outono, inverno ou primavera? No horário de verão, sem nenhuma dúvida.

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O horário de verão deste ano começa no dia 19 de outubro. E acaba à meia-noite do dia 15 de fevereiro de 2009. É pouco. Deveria se estender até o dia 29 de março, para comemorarmos o aniversário de Curitiba com uma hora a mais à luz do dia. Isto porque o horário de verão é uma consonância curitibana: com folga no relógio, a cidade também fica mais folgada, com muito riso e pouco siso.

Verão, outono, inverno e primavera, estas são nossas velhas conhecidas do cotidiano. Juntas, nos visitam uma vez por dia. Estações tradicionais, cheias de nove horas, tomam o chá das cinco e, às seis horas, se botam para dormir junto com o lusco-fusco.

Essas quatro estações, além de caretas, são pouco confiáveis. A primavera, então, costuma ter orgasmos precoces em plena rua: quando menos esperamos, já em agosto ela faz os ipês se derramarem em amarelo. O inverno, coitado, é agora um desnutrido. O outono, mesmo com a sua elegância de sempre, é por demais discreto e tímido. O verão, esse é um traiçoeiro.

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De todas as suas virtudes, a mais louvável do horário de verão é a pontualidade. Tem dia e hora marcados para começar e terminar. É de pontualidade inglesa até nas suas origens, no ano de 1907, quando um construtor londrino chamado William Willett (1856-1915) deu início a uma campanha para diminuir o consumo de luz artificial, ao mesmo tempo em que estimulava os britânicos a beber um tempo a mais, ludibriando assim o relógio dos pubs. Num panfleto de 1907 intitulado “Waste of Daylight” (Desperdício de Luz Diurna) Willett propôs avançar os relógios em 20 minutos nos domingos do mês de abril e retardá-los a mesma quantidade nos domingos de setembro. A polêmica com o horário do verão surgiu lá mesmo, nos pubs de Londres: os mais ortodoxos não admitiam chegar ao home sweet home depois das 22 horas, quando o taberneiro batia o sino atrás do balcão e todo mundo ia sonhar com a rainha. Willett, que deve ter bebido muita cerveja além do horário estabelecido, não viveu o suficiente para ver sua idéia colocada em prática. O primeiro país a adotar o horário de verão acabou sendo a Alemanha, em 1916. E dizem os mestres cervejeiros que foi em Munique, durante uma Oktoberfest.

No Brasil, onde o chope vespertino é uma instituição mais recente, o horário de verão foi decretado em 1931, por Getúlio Vargas. No começo de forma descontínua, os folguedos de fim de tarde só emplacaram definitivamente porque naquela época o Rio de Janeiro era a capital da República e foram os cariocas que introduziram o chope estupidamente gelado no Brasil, com colarinho.

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Historicamente, como está provado, o horário de verão tem tudo a ver com cerveja. Por conseguinte, a descontração, o bom humor, a alegria de viver. Titus Maccius Plautus (254-184 d.C.) deixou escrito: “Os deuses instilaram ansiedade no primeiro homem que descobriu como distinguir as horas”. O horário de verão é o antídoto da ansiedade. É a hora extra que os deuses, arrependidos, concederam aos escravos do relógio como bálsamo para tanto sofrimento.

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No horário de Brasília, o horário de verão começa pontualmente na zero hora do próximo dia 19. No horário de Curitiba, o horário de verão começa pontualmente às 18 horas, no Largo da Ordem, numa mesa qualquer do Bar do Alemão. O Schwarzwald, para os mais íntimos, merece a honraria de abrir os festejos: é onde se consome mais chope no Sul do Brasil.

Curitiba, portanto, tem cinco estações. Pela manhã o inverno, em torno das dez horas o outono, ao meio-dia o verão, à tarde a primavera e, no fim do expediente, aquela uma hora a mais que nos traz o clima da bem-aventurança.