Guru da Barreirinha

Como deve ser numa festa de polaco, o escritor Thadeu Wojciechowski vai lançar durante três dias seguidos seu mais novo livro Koan do Como Onde, assinado por Saboro Nossuco, alter ego de Wojciechowski, o Guru da Barreirinha. Na mistura de rollmops com algodão doce, filosofia e poesia, resta uma saborosa obra salpicada de fino humor.

Antes que alguém pergunte, Thadeu explica que “Koan”, no Zen-Budismo, é narrativa, diálogo, exposição de questões inacessíves à razão. Um koan famoso pergunta: “Batendo duas mãos uma na outra temos um som; qual é o som de uma mão?”. Também músico e compositor, com certeza Thadeu Wojciechowski tem várias respostas na ponta da língua, afiada com poesia, para este “koan” de tradição oral.

Quanto à origem de Saboro Nossuco, o Guru da Barreirinha que se confunde com o próprio Thadeu Wojciechowski, sua sucinta biografia é tibetana: “Para o Dalai Lama, Saboro Nossuco nasceu por obra e graça de um espírito santo zombeteiro. E por causa desta má influência, na infância, foi um verdadeiro capeta. Matava passarinho, soltava balão, fazia malcriação com as menininhas, roubava dinheiro das capelinhas, enfim, tinha mais pecado na alma que população na China. Mas um dia, Dalai Lama não sabe exatamente quando, Saboro sentiu-se bem bonzinho. E virou um amor de pessoa. Hoje no seu modesto templo, situado na Barreirinha, faz verdadeiros milagres para sobreviver”.

A seguir, alguns ensinamentos oriundos da Barreirinha:

***

Jesus vivia com fome:

– Tem pão, mãe?

E Maria sempre lhe dava um belo naco. Jesus pegava e saía correndo que nem louco. Maria ainda o avisava dos perigos, mas Jesus nem dava bola.

À noitinha, quando Jesus voltava para casa, ela perguntava:

– Onde estiveste, filho?

E ele, bocejando: – Por aí, mãe!

E caía duro na cama, dormindo. De manhãzinha, Maria acordava e Jesus já tinha se mandado. Maria punha a mão sobre o coração e rezava por ele, preocupada.

Um dia, Jesus demorou demais e ela pediu a José que fosse procurá-lo. José, meio a contragosto, foi e encontrou-o no meio do caminho:

– Tua mãe tá preocupada.

– Por quê?

– Ah, sei lá!

– Ela não entende.

– O que, filho?

– Que meu pai me deu novas atribuições.

– Eu?

– Ah, deixa pra lá, pai!

***

– Mestre, dá para tapar o sol do sofrimento com a peneira da felicidade?

– Não é possível.

– Mas a ilusão às vezes faz bem…

– Não é possível.

– Então devemos crer que viver é sofrer?

– Não é possível.

– Mas se nada disso é viável, a morte então é a única saída.

– Não é possível.

– Fiquei confuso, mestre.

– Agora tudo é possível!

***

– Mestre, o que tenho que fazer para me tornar um sábio?

– Quando?

– Agora mesmo, por exemplo.

– Risca a palavra sábio do teu dicionário.

– Risquei, mas não me sinto um sábio.

– Verifica então se nele consta “ignorante”.

– Sim está aqui “aquele que ignora, que não sabe”.

Assim Mestre Kua Huo passou manhã, tarde e boa parte da noite. Encadeando centenas de palavras, na busca de uma possível resposta para a primeira pergunta de seu discípulo Um Lin que, no outro dia, cedinho, já está batendo na sua porta.

– Mestre Kua Huo!?

– Sim. Ah és tu, Um Lin! Que desejas?

– Mestre, o que tenho que fazer para não fazer perguntas idiotas?

– Evitar a garubalha.

– …?

– Vai, pega o dicionário!

***

– Mestre, como diferencias um idiota de uma pessoa comum?

– Não diferencio.

– Por que não?

– Tu te tornarias uma pessoa comum.

***

– Mestre, a solidão é um bem ou um mal?

– Neste momento, seria um bem.

***

O lançamento de Koan do Como Onde, de Saboro Nossuco (Thadeu Wojciechowski) acontece hoje, amanhã e domingo no Original Beto Batata, na Rua Prof. Brandão, 678. (Editora Bernúncia, 116 páginas, R$ 20).