Governo de palavras

O jornalista (com diploma) Roberto Requião deseja deletar (epa!) palavras estrangeiras. Segundo o projeto de inspiração xenófoba, as palavras alienígenas (o inglês é uma língua de outro planeta) deverão ser traduzidas com o “objetivo de valorizar e reconhecer a língua portuguesa” (do Brasil ou de Portugal?).

O governador, quando leu a minuta do decreto, chamou a secretária e ordenou: “Não gostei do segundo parágrafo. Deleta isso aí!”.

Dizem que a língua é o chicote do dono. No caso de Roberto Requião, a frase é justa. Só não nos surpreende (como se ainda nos guardasse alguma surpresa) é que agora ele faz uso da língua para chicotear a voz do povo: o descumprimento implicará em uma multa de R$ 5 mil na primeira ocorrência.

Portanto, os restaurantes que reservem uma suculenta parte da receita para cobrir as multas do cardápio, que tratem de traduzir estas barbaridades: “Carpaccio di trota salmonata su erbette”, ou “Salmon trout carpaccio with wild salad” (os atrasados dos ingleses não traduzem “carpaccio”).

No bom português palaciano “carppacio” seria “carne crua fatiada bem fininha”? Considerando minha ignorância linguística, sinceramente, não sei como traduziria essa bela palavra italiana, insubstituível para qualquer chef que não frequente a mesa do governador. Porém, considerando também que o governador guarda no fígado um “mix” de paixão e ódio pela “mídia”, e nunca deixa de usar essa palavra (do inglês “mass” media), convém trazer o parecer de um especialista.

Publicitário, jornalista e professor de Comunicação, João José Werzbitzki (Master of arts/ Communications) escreveu em seu concorrido blog (http://blogs.abril.com.br /blogdojj) o que o “comunicólogo” Roberto Requião devia ler, se é que o governador (foi amigo íntimo do escritor Jamil Snege) tem lido alguma coisa nos últimos tempos, além dos relatórios de intrigas.

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“Há cerca de um mês alertei para diversas pessoas que são líderes da nossa comunidade organizada, sobre mais este absurdo populista e anticonstitucional do governador do Paraná (cujo nome prefiro não citar, pois não merece registro). Alertei também que se não houver mobilização, dos anunciantes e dos publicitários, assim como dos proprietários de veículos de comunicação, a Assembleia Legislativa capacho iria aprovar a lei… como está fazendo, por pura ignorância mercadológica e linguística, ou por ser mesmo serviçal ao imperador (se acha, pelo menos) do Paraná. O projeto de lei é absolutamente inconstitucional, pois fere o direito de livre expressão. Pior do que escrever em outro idioma é escrever errado – e não há leis para isso.

A punição a quem abusa das palavras estrangeiras é exemplar, porque os consumidores não compreendem as mensagens e não compram. Esse é o castigo maior ao anunciante e ao publicitário. Não é a multa de 5 mil reais.

Como se traduz pizza, governador? E os termos diet e light, que são usados na regulamentação da Anvisa, para alimentos e bebidas? Vai acabar com a web e a internet? Ou e-mail? Exterminará o abatjour? Ou o metrô? Ou twitter? Ou check-up? Com tantas coisas mais importantes a serem feitas para e pelo povo do Paraná, este governador perde tempo e dinheiro com futilidades e inutilidades. É um péssimo governador, com uma Assembleia Legislativa que nos envergonha de tão servil. Se aprovarem esta lei que obriga a traduzir as palavras estrangeiras na publicidade, estarão passando a si mesmos o atestado da ignorância e da incompetência de enfrentar o “poderoso” governador. Os cariocas já derrubaram lei igual (aqui só copiaram, sem saber que a Justiça carioca a declarara inconstitucional). Os deputados paranaenses vão pagar mais um mico, com o governador. Consultei diversos advogados, que garantem que esta ação é inconstitucional, por interferir na liberdade de expressão que todos temos assegurada. (…) Só pode ser ignorância, de quem aprovar esta insanidade. (…) Quanto pior, melhor – parece ser a estratégia governamental no nosso Paraná. Que vergonha!”