Folgados

O que seria um folgado? Para o compositor Noel Rosa, um “Rapaz folgado” deu até samba:

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Deixa de arrastar o teu tamanco / Pois tamanco nunca foi sandália / E tira do pescoço o lenço branco / Compra sapato e gravata / Joga fora esta navalha que te atrapalha / Com chapéu do lado deste rata / Da polícia quero que escapes / Fazendo um samba-canção / Já te dei papel e lápis / Arranja um amor e um violão

Malandro é palavra derrotista / Que só serve pra tirar / Todo o valor do sambista / Proponho ao povo civilizado / Não te chamar de malandro / E sim de rapaz folgado

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Do Noel para o Aurélio, no pai dos burros vale o que está escrito. Folgado é um rapaz despreocupado, espaçoso, dilatado, desassustado, descuidado, remansado, descansado, lasso, frouxo, um malandro, enfim, para usar o sinônimo derrotista que desagradava o sambista da Vila Isabel.

Folgado de quatro costados era um amigo “muy amigo” do publicitário e escritor Ernani Buchmann. Encarregado de dirigir um filme publicitário em Nova York, ele estava na selecionando locações em Manhattan quando Curitiba o chamou ao celular:

– Ernani, preciso de um favor teu urgente, urgentíssimo! Caso de vida ou morte!

– Diga!

– Minha sobrinha está precisando de um remédio que só tem aí em Nova York. Precisamos dele até segunda-feira.

– Hoje é sábado, onde vou conseguir?

– Na Farmácia. Compra e me manda no primeiro avião!

Ernani largou as filmagens e foi à luta: subornou o mexicano da farmácia para fornecer o medicamento só vendido sob receita médica, no aeroporto consegui achar um tripulante de uma companhia aérea de partida para o Brasil e – ufa! – na segunda-feira à tarde o remédio milagroso estava em Curitiba. Somando-se tudo isso, a conta quase chegou a mil dólares.

Vida que segue, a despesa foi para conta do publicitário, e que Deus lhe pague! Dois meses depois, estava Ernani Buchmann posto em sossego no litoral, quando o celular o tirou da beira da piscina:

– Meu caro, estava aqui falando com a minha mulher: precisamos tomar um uísque na casa do Ernani para agradecer pessoalmente o remédio de Nova York…