Sem mentira nenhuma, abril foi perverso com um círculo de artistas e jornalistas de Curitiba. Além de perdermos Carlos Zanello de Aguiar – o Macaxeira -, fotógrafo de 66 anos de idade que nos deixou a famosa imagem do poeta Paulo Leminski soprando uma flor, dos mais sentidos foi o inesperado falecimento do chargista e artista gráfico Carlos Alberto Noviski, aos 49 anos.

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Peso pesado do humor, além dos seus 200 e tantos quilos, Noviski era da estirpe de outro cartunista e artista gráfico sempre em guerra com a balança: Marcel Leite, falecido de ataque cardíaco em plena redação do jornal O Dia, é personagem das melhores histórias da imprensa paranaense. Duas delas ficaram para o folclore da boemia curitibana, com todas as suas versões ao longo do tempo.

Como era rotina, Marcel saía da redação do O Dia depois do fechamento do jornal e rumava para o Bar Palácio. Na longa mesa à direita, os companheiros de sempre. Como se fosse um “moto-contínuo” a servir cerveja, ninguém arredava o pé enquanto todos não fossem embora juntos. Como se sabe, os curitibanos adoram elogiar os outros pelas costas.

Certa noite, um deles pediu licença para se retirar:

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– Meus caros, sinto muito mas vou lhes deixar: minha mãe morreu! A família me aguarda no Cemitério Municipal. Boa noite a todos.

O camarada pegou o sobretudo, o cachecol e o chapéu pendurados naqueles civilizados cabides do velho restaurante e sumiu na bruma da Rua Barão do Rio Branco.

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A saída deixou todos mudos na mesa. Não tanto de pesar, muito mais de perplexidade. Naquele silêncio de cortar com a faca, Marcel Leite falou ao garçom Mozart que estava ao lado. Ou seria o Adriano?

– Esse desalmado poderia pelo menos ter tomada uma cerveja preta em respeito à progenitora!

Nowiski não morreu trabalhando numa redação do jornal. Infelizmente, os jornais em que trabalhou morreram antes dele. Sua morte foi consequência de um tombo no banheiro de sua casa – por ironia, dos tantos tombos que os cartunistas têm levado nos últimos tempos, alguns deles trágicos -, depois de sair de uma cirurgia bem sucedida de redução do estômago.

Nos finalmentes estava o jornalista Renan Sedano Ruiz. Gaúcho, morando e trabalhando em Florianópolis nos últimos anos, Renan era diagramador e artista gráfico, com larga trajetória na imprensa paranaense, onde se destacou na luta sindical – bem antes dos companheiros petistas declararem como suas todas as conquistas sindicais nos tempos da ditadura.

Os amigos ficaram sabendo do sucedido com Renan através de Claire , a sua mulher: “Agora depois de tanta correria, aflição, por fim o que mais temíamos aconteceu. O grande Renan nos deixou. Há menos de um mês depois de uma longa via sacra passando por médicos tentando resolver um longo problema de constipação, foi confirmado que na verdade se tratava de um câncer no pulmão que já havia se transformado em uma metástase, afetando inclusive uma das vértebras que o paralisou. Internado, ficamos sabendo que pouco poderia ser feito. Foram dias de muita angústia e sofrimento para o Renan e nós da família”.

O desfecho final foi trágico. Valente, melhor dizendo, para usar uma palavra mais apropriada. Sentindo que eram os seus últimos dias, Renan mandou chamar a mãe em Porto Alegre. Assim que ela chegou para o abraço de conforto, ele aproveitou um momento em que ficou sozinho para se libertar das amarras que eram os soros e do tubo de oxigênio. Arrancou tudo o que ainda lhe prendia em vida para gritar com o fiapo de força que ainda lhe restava:

– BASTA!!!

Conforme sempre pediu em vida, seu corpo foi encaminhado ao Centro de Pesquisa do Corpo Humano da UFSC. “Agora só nos resta um tremendo vazio e o começo de uma penosa saudade”, assim Claire se despediu do marido.