Falanstério petista

É sempre assim. Termina o processo eleitoral, mas não acaba o terceiro turno entre Imprensa & Governo. Foi assim há quatro anos, quando a recém-eleita Dilma Rousseff discursou em defesa da liberdade de imprensa, afirmando que prefere o barulho de uma imprensa livre ao silêncio das ditaduras.

Sob a saia da “presidenta”, quem puxou a polêmica foi o “nervioso” jornalista Franklin Martins, ao cerrar os dentes para afirmar que a discussão de novas regras para a imprensa seria feita por “entendimento ou enfrentamento”. Ou vai, ou racha! Para justificar o seu projeto de agregar a livre imprensa ao Diário Oficial, o ex-guerrilheiro de codinome Valdir argumentava que “o Brasil é bem grandinho para adotar o próprio modelo” de controle dos meios de comunicação.

Só faltou Franklin Martins citar o francês Charles Fourier, que em 1822 escreveu o seguinte: “Entre todas as asneiras de nosso século, não há nada mais funesto que o espírito de liberdade, bom e louvável, abstratamente, mas tão mal conduzido, como aplicação, que aliou às bandeiras do despotismo justamente aqueles que tinham preferência pela liberdade. Uma lamentável experiência demonstrou que nessas belas teorias só há ilusão ou uso pejorativo”.

Com todo o respeito a Charles Fourier, uma das cabeças mais originais do século XIX, Franklin Martins se revelou um “falansteriano” em retardo. Considerando que veio da mesma cepa de Dilma, o ex-guerrilheiro não desejava um “ministério”.

Mas sim um “falanstério”. Ou seja, comunidades sonhadas por Charles Fourier onde todos trabalham em prol de todos, sem divisão de classes. Pela doutrina de Fourier, para fazer parte de um “falanstério” seria preciso “evoluir, abandonar o individualismo e ter o bem comum como meta”. Assim, na discussão que o governo petista insiste em levar adiante, Franklin Martins propunha que todos os meios de comunicações fossem regulamentados como “falanstérios”. Sem patrões e empregados, a Rede Globo, por exemplo, seria transformada em uma organização comunal harmônica e descentralizada, onde os jornalistas trabalhariam guiados por suas respectivas paixões e ideologias, sendo que a pauta do Jornal Nacional seria decidida conforme consulta aos anseios da sociedade organizada.

Charles Fourier, o primeiro a anunciar que o grau de emancipação da mulher é a medida natural da emancipação geral, só não teria lugar num possível “falanstério petista” porque não exibia a carranca de Franklin Martins. Além de crítico, Fourier era um dos maiores satíricos de seu tempo. Ao explicar seu projeto de mudar o mundo, ele dizia que “Deus quer nos guiar pelo prazer e não pelas privações. É sempre na direção do luxo e das volúpias que devemos nos concentrar para descobrir as mais profundas especulações de Deus sobre a harmonia social”.

Decididamente, Charles Fourier não teria assento no “falanstério da dona Dilma”. Longe disso. Principalmente se o francês resolvesse arrolar, como fez em 1808, os diversos tipos de “cornudos”. Pelas ruas de Paris, ele encontrou 72 tipos de chifres para homens e outro tanto para mulheres. O que o levou a concluir: “Observemos, para vergonha do século e confusão de suas ciências políticas e morais, que a opinião pública condenaria esta análise do adultério por demasiado justa, demasiado exata, demasiado completa…”.