Especialmente depois de um processo eleitoral tão desatinado, o Natal devia ser antecipado para 25 de novembro. Com o bimbalhar dos sinos, a nuvem negra que acompanha a cabeça dos vencidos talvez se dissipasse e, assim, o espírito natalino talvez amainasse a empáfia dos vencedores.

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Com ou sem revisão do calendário, não há como desconhecer que já em meados de novembro começamos a sentir os primeiros sintomas da TPN. A temerosa Tensão Pré-Natalina, moléstia dos nervos que provoca um frio na barriga aos primeiros acordes de “Jingle Bells”.

Vítimas da TPN, o casal Nicolau e Nicoleta está à beira de um ataque de nervos. Chamados à razão pelo terapeuta da família, foram aconselhados a fazer uma lista de prioridades para os próximos 35 dias de sufoco:

1) comer melhor e com calma, mastigar bem e evitar comida de praça de alimentação de shopping; 2) caminhar no parque e não de loja em loja; 3) evitar surpresas no cartão de crédito; 4) organizar a agenda de confraternizações, jantares e só comparecer a encontros festivos com a garantia de não encontrar os inimigos secretos de sempre; 5) preparar o espírito para enfrentar o trânsito, o furor aquisitivo, o telemarketing, panfletagens, promoções e resistir, se puder, ao sorteio de automóveis em troca do valor das compras; 6) meteorologia é bobagem, mais confiável é consultar os búzios antes de fazer as malas para a temporada na praia (confira com atenção se a empregada doméstica está bem acomodada na frasqueira); 7) preparar a bolsinha de remédios, o estoque de protetor solar e não se esquecer de preparar o kit-iemanjá para a virada do ano: lentilhas, uvas, cueca amarela, camisa branca, champanhe que não seja de sidra e muita paciência, muita paciência, com foguetório 24 horas do maldito vizinho de praia.

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Ah, os fogos de artifício! No último Natal, quando Nicolau voltou para casa depois da festa do amigo secreto (era um pouquinho tarde, ele confessa) a esposa Nicoleta o aguardava com uma notícia que caiu como um rojão:
– Perdi o meu espírito natalino!
– Não acredito!
– Já procurei por tudo. Já liguei até para o Luiz Carlos Martins, na Banda B, oferecendo mil reais para o ouvinte que o achar.
– Calma, não entre em desespero. Vamos recapitular por onde você andou hoje. Foi ao shopping?
– Fui.
– Então está na cara que você perdeu o espírito natalino com o preço de um tênis da Nike.
– Não foi isso. Depois do shopping passei na igreja dos Capuchinhos e, se bem lembro, enquanto me benzia ainda estava com ele.
– E depois da bênção dos Capuchinhos?
– Entrei na Rua Desembargador Motta e fui visitar tua mãe na Água Verde.
– Com certeza! Você perdeu o espírito natalino no triângulo das Bermudas da Rua Desembargador Motta, Brigadeiro Franco e Silva Jardim.
– Também não foi no engarrafamento. Lembro que antes de discutir com tua mãe onde seria a ceia de Natal, na nossa casa ou na casa da tua irmã, eu ainda estava com espírito natalino. Mas saí de lá bem calminha e fui ao supermercado.
– Pronto! Você esqueceu o espírito natalino no caixa.
– Pode ser. Mas se eu estivesse sem o espírito natalino, não teria comprado tanto chocolate.
– Perdemos o Natal!
– Nicolau, onde será que deixei o espírito natalino?
– Sei lá, Nicoleta! Em algum lugar do passado!