Um dos passatempos do curitibano é maldizer a própria sorte de viver em Curitiba. Passatempo no verdadeiro sentido da palavra (divertimento, diversão, entretenimento), porque é próprio do curitibano rir de si mesmo, fazer humor com suas próprias lamentações. Exemplos são as tantas piadas que se faz sobre o curitibano que não cumprimenta o vizinho. Assim como o escritor Gay Talese vê a sua Nova York: “É uma cidade de vizinhanças em que as pessoas não têm vizinhos”.

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O vizinho, a calçada e o clima, são estes os passatempos preferidos dos curitibanos. “Como dói viver em Curitiba”, se queixava por escrito o professor Temítocles Linhares (1905-1993), curitibaníssimo, crítico literário do jornal O Estado de S. Paulo e autor, entre outros, da “História crítica do romance brasileiro”.

Num trecho de suas memórias (Diário de um crítico – de 1963 a 1982), aquele que foi um dos grandes amigos de Dalton Trevisan escreveu um tópico que parece ter sido escrito hoje.

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“Esse mau tempo faz supor estarmos num país nórdico europeu, onde dificilmente o sol aparece. Curitiba, que nunca primou por bom clima (será por causa da altitude?), está ficando muito civilizada, bem próxima do fog londrino. É uma contradição: civilizada sob esse aspecto negativo, para quem, como eu, gosta do sol, do calor procriador que nos faz pensar na vida e não na morte. Isso, de qualquer forma, explica ter havido aqui um movimento simbolista (produto nórdico por excelência), o mais importante do Brasil, porque o chamado decadentismo encontrou aqui o que lhe era essencial: o ambiente, o que hoje se chama de ecologia. A sua ecologia, portanto. Nesse sentido, Curitiba ainda continua a ser a cidade da neblina, da névoa, da alta capacidade evocativa, obrigando as pessoas a não sair de casa, aconchegadas ao fogo da lareira, coisa que não existe quase aqui, pois os arquitetos não pensaram neste detalhe, planejando construções mais de verão do que de inverno. Parecem ter sido partidários do frio e então, dentro do raciocínio lógico, bem cartesiano, quanto mais frio as pessoas sentirem melhor. Para eles, chega a ser sinônimo de saúde. Erro crasso, uma vez que no frio é que se contraem as piores doenças, as de fundo respiratório, como a asma, a pneumonia aguda, a tuberculose etc. Os resfriados são constantes e eles nos debilitam o organismo. Aqui é raro alguém chegar aos 80 anos, coisa hoje banal em outras cidades. É preciso ser de aço para agüentar esses dias penumbrentos, esse clima sem verão, sem sol, sem calor, sem vida.

 Ah! Como dói viver em Curitiba”.

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