O poder corrompe e todo político é corrupto? Qualquer generalização é burra. Mas, convenhamos, as últimas notícias que nos chegam aqui na vala comum nos levam a crer que sim. A família Sarney voltou à cena e até Fernando Collor protagoniza um “revival” dos idos da Casa da Dinda. São velhos filmes tristes.

continua após a publicidade

Mesmo assim, existem exceções? Elas existem, segundo Henry Kissinger, porém “noventa por cento dos políticos dão aos dez por cento restantes uma péssima reputação”. Henry Kissinger sabia o que dizia, sendo velha águia que conhecia a realidade política do primeiro ao quinto mundos.

A escritora Marta Gellhorn conta que, das tantas guerras que cobriu (começando pela Guerra Civil Espanhola), aprendeu uma lição acerca da realidade política: “Era uma lição importante para mim porque eu decidi que tinha aprendido a mesma coisa repetidamente por tempo suficiente: a realidade política e a moralidade política não tinham nada a ver uma com a outra. A política deve ser mesmo uma profissão horrível, considerando os terríveis covardes morais em que a maioria dos políticos se transforma assim que arruma um emprego. É inútil jogar a culpa nos líderes em uma democracia, já que fomos nós que os colocamos ali, para começo de conversa, e, uma vez lá, eles estão sujeitos à lei: o poder corrompe. Mas não vejo necessidade de idolatrar como herói nenhum deles”.

No livro A face da guerra, a primeira escritora a cobrir uma guerra nos revela também a verdadeira face dos líderes políticos, que é a mesma em qualquer pocilga do planeta: “Nenhuma estatística mostra de maneira mais clara os erros na conduta do governo como este: o mundo gastou 36 mil dólares por ano por soldado e 1.100 dólares por ano por estudante. Os dados são de 1986, as estatísticas mais recentes, e notou-se um grande aumento em relação a 1984, quando se pagavam 29 mil dólares por ano por soldado. Podemos ter certeza absoluta de que o preço é mais alto agora e o contraste igualmente obsceno”.

continua após a publicidade

Voltando à guerra nossa de cada dia, na política não temos nenhum herói a quem reverenciar? Mesmo sabendo que não temos, devemos idolatrar como herói nenhum deles?

De certa forma, herói foi o Clodovil, que morreu pobre. Não tinha nenhum bem atualmente e passava por dificuldades financeiras. Do salário de R$ 16,5 mil, recebia R$ 7 mil líquidos por conta de pagamento de empréstimo consignado em folha de pagamento. Segundo a advogada do costureiro, “ele nunca foi um deputado de tramoia, pode falar dele o que quiser, menos isso”.

continua após a publicidade

Uma história de vida puxa a outra e aqui no Paraná existiu um político que, se não foi um herói, teve o seu momento de heroísmo: o ex-senador Enéas Faria morreu pobre, aos 63 anos. Vereador, deputado estadual, deputado federal, seguiu para o Senado na vaga de José Richa. Formado em direito e filosofia, Enéas foi ainda secretário do Senado.

Para atualizar a biografia de Enéas Faria, a história de heroísmo que poucos conhecem: suplente do senador, certo dia o empresário José Carlos de Carvalho (o Carvalhinho) pegou carona no avião do Banco Bamerindus e voou a Brasília com o firme propósito de se tornar senador com uma bolsa de dólares. E não era uma bolsa qualquer, era uma legítima Louis Vuitton comprada em Paris.

Com aquele seu jeito espevitado, o elétrico Carvalhinho entrou no gabinete de Enéas Faria como um fio desencapado:
– Enéas, abra essa bolsa!

Enéas abriu a legítima Vuitton e, num gesto automático, precisou limpar os óculos para ver se estava enxergando direito.

– Duzentos mil dólares, Enéas! Duzentos mil dólares para você se licenciar e eu me tornar senador. É o meu sonho! Você está quebrado, Enéas. Essa bolsa vai ajeitar a tua vida.

Enéas teve o seu dia de herói. O senador do Paraná ajeitou os óculos e respondeu:

– Carvalhinho, estou quebrado, mas se depender de mim, você nunca será senador!

A bolsa Louis Vuitton voltou como veio.