Desmonte de um artista

A casa João Turin foi desmontada. Depois de 23 anos na Rua Mateus Leme, o museu dedicado ao escultor paranaense, que se destacou na primeira metade do século passado e integrou o movimento paranista, não está mais funcionando. Uma parte do seu acervo foi vendida para particulares e a parte documental foi devidamente empacotada e despachada para a reserva técnica do Museu Oscar Niemeyer.

Considerado por muitos um artista à frente de seu tempo, cheio de estilo e com formação artística na Bélgica e na França, com sua casa fechada definitivamente João Turin foi desmontado duas vezes. O primeiro desmonte foi pelas mãos do escritor Dalton Trevisan. “Turin”, de forma curta e grossa, é o título da “ordem de despejo” assinada pelo Vampiro de Curitiba, quando o precursor da escultura no Paraná foi colocado no olho da rua para zombaria pública.       

*********

“Casa João Turin: a porta se abre para o vazio, as janelas olham para o nada. Fosse tão medíocre não me lembrava. Mesquinho talento, nenhuma grandeza. Pobres bustos. Lamentáveis onças, baixos-relevos desde o nome. Nem lampejo de originalidade, nadinha que se salve. Como se explicam os prêmios? Ora, prêmio de salão. E os doze anos de Paris, de que serviram? Me lembro dele, a sua melhor escultura. Grandalhão, bruto naso, imponente de bengala. Majestoso, ele, sim, uma estátua viva. Revolta cabeleira, vozeirão macarrônico, o prestígio dos longos anos em Parigi. Ah, o chapelão de boêmio de opereta. Isso mesmo: personagem de opereta. Gargântua inofensivo, adorado pelos amigos. Visitei-o no estúdio, mais artístico que o artista. O fascínio de sua presença desarmava qualquer crítico. Me acode agora, fui ao seu enterro, muito concorrido. O orador de um gorjeio só: Turin, a voz da terra! Ai de quem morre em Curitiba. Ai do nosso príncipe feliz, péssimo acadêmico, nenhuma garra. Engenho pífio, será que não desconfiava? No homem tudo era grande: a manzorra, o narigão vermelho, o brado retumbante. Na obra, tudo pequeno: concepção, fatura, material. Há que distinguir, sem ofensa: uma não vale o outro. Tão bonita a casa, mais parece museu de horrores. (…) Pomposo Turin, bom gigante, mofino artesão. Pobre dele, ai de nós. Resgatar a memória é isso: Emiliano, o nosso Rilke? Turin o nosso Rodin? Dario, o Socrates II nosso? Mossurunga, o nosso Beethoven? De Bona, o Miguelangelo nosso? Ufanismo paranista, o último refúgio dos medíocres”.