Porque hoje é sexta-feira, dia para começar a escolher onde se divertir com a feijoada de sábado (feijoada requer bom humor à mesa, além da ambulância na porta), tenho a lhes oferecer como aperitivo um trecho do livro “Aus der Bai von Paranaguá” (Da Baía de Paranaguá), diário que o pintor e botânico alemão Julius Platzmann escreveu durante sua estada no nosso litoral (mais precisamente na Ilha dos Pinheiros) entre 1858 e 1864.

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Com o apoio de Henrique Paulo Schmidlin (o Vitamina), o engenheiro e escritor Francisco Lothar Paulo Lange traduziu esse inédito relato de viagens e aventuras, com preciosas revelações sobre hábitos e costumes dos nativos da baía de Paranaguá, inclusive com as receitas do que a generosa natureza punha na mesa do curioso alemão. Das laranjas de inverno, aos mariscos com mais de um palmo de cumprimento, passando pelos pinhões assados (de bater com as duas mãos na barriga e dizer vinte vezes seguidas: bom, bom, bom…), Julius descreve o cardápio do dia:

“A refeição principal normalmente consiste de feijão preto, charque, toicinho, palmito, taiá e pedaços de abóbora. Tudo isso junto deve ser cozido por longo tempo, exala um cheiro de chocolate e chama-se feijoada, importante e saborosa comida nacional brasileira. Durante a refeição, cada bocado é espargido com farinha de mandioca; o assim chamado repolho-de-palmeiras, palmito, pouco se assemelha com o repolho, mas sim com aspargos”.

Platzmann não conta quem o ensinou que palmito é um repolho com gosto de aspargos. Em compensação, ele nos apresenta dona Marica, pelo visto a melhor cozinheira daqueles antanhos de 1860.

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“Se o pescador brasileiro bem conhece o seu trabalho fora de casa, assim sua companheira de vida conhece o seu, dentro de casa. Mas nem todos têm a felicidade de ter uma mão `fria´, pela qual nenhum peixe estrague. Aquela que tem a infelicidade de ter uma mão ‘quente´, quando da ocasião de preparar o peixe, nem aparece, pois somente sua presença iria prejudicar o processo de preparo. A senhora Marica tem a mão `fria´, e quando suas mãos não são suficientes é pedida ajuda”.

Muita ajuda, dona Marica precisava: À noite, conta o viajante que não raro saia com os pescadores para “camaroar”, capturar caranguejo e camarão: “De volta, quando chegamos à casa, a senhora Marica está assando sobre brasas, os azulados, esverdeados, avermelhados camarões recém-chegados do mar. (…) Sentados junto ao fogo, para o jantar não há necessidade de mesa e, na realidade, não pode haver cardápio melhor em algum lugar”.

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