Delações premiadíssimas

Ao lembrar sua passagem como prisioneira da ditadura militar e dizer que aprendeu na escola a não gostar de Joaquim Silvério dos Reis, o delator da Inconfidência Mineira, Dilma Rousseff reconhece que é preciso buscar na história alguns exemplos para explicar os acontecimentos recentes.

A presidente deve ter razões inconfessáveis quando afirma que não respeita os delatores. Apesar de ter sido justamente ela que sancionou a lei reguladora do instituto da Delação Premiada (Lei 12850/ 2013), instrumento traiçoeiro que já derrubou muita gente ao longo da história. Para o bem ou para o mal, começou quando Adão e Eva foram delatados em troca de um pomar; chegou aos trinta dinheiros de Judas Iscariotes; e ganhou a força na Rússia Imperial, quando Pedro, o Grande, sancionou em 1713 a lei das “delações premiadíssimas”.

O decreto ordenava que todos os delatores seriam recebidos pessoalmente pelo czar, em qualquer caso de corrupção no governo. O prêmio para o delator seria toda a fortuna e demais propriedades do acusado, caso a alegação se provasse verdadeira. Isso podia ser perigoso demais para as pessoas: o delator tinha que se apresentar e provar suas alegações e, se elas fossem falsas, quem perdia a cabeça era o acusador e não o acusado. O resultado foi uma enxurrada de cartas anônimas, a maioria com o propósito de acertar contas pessoais.

A corrupção predominava em todos os escalões do Império. Principalmente junto à família imperial. Certa vez, conta o biógrafo Robert K. Massie, após ouvir o relato de casos escabrosos de corrupção, num acesso de raiva Pedro ordenou a imediata execução de qualquer oficial que subtraísse o Estado, mesmo que fosse um pedaço de corda. Ao redigir o decreto, o ministro ergueu a caneta e perguntou:

– Vossa Majestade já refletiu sobre as consequências desse decreto?

– Vá em frente! Escreva! – respondeu Pedro furiosamente.

– Vossa majestade quer viver sozinho, sem súditos no Império? Pois todos nós roubamos. Alguns levam, pouco, outros levam muito, mas todos nós levamos alguma coisa!

Pedro, o Grande, deu risada, sacudiu tristemente a cabeça e desistiu do decreto.

Karl Marx devia conhecer esse episódio, ao dizer que a história se repete. Primeiro como tragédia, depois como farsa. No caso brasileiro, a farsa está sendo uma tragédia para Dilma Rousseff.