Se existia alguma dúvida que Curitiba é feminina, esse verão metido a macho que acaba de sair – deixando para trás os decotes imaginativos e a leveza das saias – nos convenceu da semelhança entre as cidades e as mulheres, tese defendida por Jaime Lerner e Luiz Fernando Verissimo.

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Talvez tenha sido um sopro edipiano que tenha inspirado Lerner e Verissimo, sendo os dois confessadamente apaixonados pelas cidades que lhes serviram de útero: Curitiba e Porto Alegre. Paixões que ambos repartem com Paris e Nova York, suas amantes de longa data.

Especialmente Jaime Lerner, que, estudante de arquitetura em Paris, conheceu, ainda bem jovem, a fêmea com as curvas sensuais do Sena: “Paris é chique, uma mulher sempre vestida para um casamento. Nova York é uma mulher toda tatuada”.

Verissimo lembra que na Bíblia temos duas personagens marcadamente femininas: Babilônia, a grande prostituta, “vestida de linho fino, de púrpura, de escarlate e adornada com ouro e pedras preciosas e pérolas”, cujos pecados se acumularam até o céu e provocaram sua destruição, e Jerusalém, a “mulher do Cordeiro” que desce do céu, “como uma esposa ataviada para seu marido”, no advir dos novos tempos.

Um forasteiro diria que Curitiba, assim como uma mulher, tem seus altos e baixos. Para quem a estranha, é uma fêmea que sofre de transtorno bipolar em dobro, com um temperamento que oscila entre quatro estações num mesmo dia. Ela amanhece ensolarada sobrando euforia na paisagem. Por volta do meio-dia, nota-se que o céu escurece, sopra o vento sul e um velado mau humor toma conta das ruas. Em seguida, sol e chuva casamento de viúva. E toda aquela euforia do início da manhã escorre para o inferno das calçadas. O sol aqui e ali nos acena entre uma nuvem e outra, mas falta-lhe disposição para o chá das cinco. Com a luminosidade em altos e baixos, este inferno emocional só tende a piorar no início da noite, quando um friozinho malicioso convida ao aconchego.

Pecadora e virtuosa, Curitiba é a madame do Batel de cinta-liga, com sapatos sujos de lama da periferia. É uma bela balzaquiana com topete de colegial em busca da eterna fonte da juventude. Uma mulher de temperamento oscilante, uma criatura imprevisível. E só ela tem o poder de ser assim num único dia: forte e feliz, pela manhã; frágil, no meio do dia; nostálgica e carente no meio da tarde; amada e rejeitada ao anoitecer. Primavera, verão, outono e inverno, em intervalos de minutos.

Mesmo quando acaba o verão, em Curitiba a festa continua: em 29 de março o aniversário e, no dia-a-dia,o mês dedicado internacionalmente às mulheres.

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