Corruptos das galés

Em se tratando de habeas corpus, lembro muito bem de um dos melhores bares de Curitiba e que se chamava “Habeas Copus”. Vivia cheio de mulheres bonitas e, justamente por isso, era frequentado por tantos advogados que em certas noites mais parecia porta de cadeia. Nesse prende, solta e volta a prender (até um adversário pediu um habeas corpus preventivo do Lula), só tem um jeito de segurar os corruptos na prisão: voltar ao tempo em que os condenados cumpriam pena de trabalhos forçados nas galés em alto mar. Distantes dos olhos míopes da Justiça, bem pra lá do fim do mundo.

No tempo em que bandido não tinha perdão em terra firme, o Código Criminal de 1830 determinava no seu artigo 44 a pena nas galés, com os condenados presos com calceta no pé e corrente de ferro, segregados como remadores nas galeras do Império. Esse exemplar serviço prestado à navegação de cabotagem no Brasil – quando uma viagem de Paranaguá ao Rio de Janeiro não era o inferno de hoje, via BR-101 – foi abolido pelo º 20, do artigo 72 da Constituição de 1891, quando já tinha sido extinto pelo Decreto nº 774, de 20.09.1890, expedido pelo Marechal Deodoro da Fonseca.

Os retratos estampados nos jornais são provas incontestáveis: esses ladravazes de colarinho branco foram talhados para os trabalhos forçados naquelas embarcações a remo, em cavernas sujas, sem ventilação e com um calor insuportável, onde o cansaço e as feridas causadas pelas chibatadas provocavam o que era considerado por muitos uma morte das mais lentas.

Na história do Brasil, o galeriano mais célebre foi um tal de Manuel Lourenço Flores, em meados do século XVIII. Já casado em Portugal, ele resolveu se casar novamente no Brasil com Maria Vieira, o que fazia dele um bígamo dos dois mundos. Sem sossegar o pito, ainda se casou pela terceira vez, com Maria das Neves, a quarta com Maria da Conceição, a quinta com Rosa Maria da Conceição e a sexta com Ana de Sousa. Flores era o que poderia se chamar de um casamenteiro incorrigível e por isso acabou sendo condenado a trabalhar nas galés durante dez anos.

Os bígamos eram santas criaturas, se comparados aos empreiteiros que vivem dos cofres da Viúva. Pelo bem da Petrobrás, restaure-se o Código Criminal de 1830. Aos auditores e fiscais corruptos da Receita Estadual, as galés!