Com aspas e sem aspas

São dois tipos de votos de júbilos: um sem aspas, outro com aspas. Tem o sincero voto de felicidades, que dispensa aspas, e tem o irônico voto com aspas: “Felicidades!” Felicidade com aspas vem com o carimbo da hipocrisia. Ou o veneno da ironia. Os inimigos não mandam flores. No máximo, telegrama de “felicidades”. 

Aspas não são apenas sinais que abrem e fecham a citação. Tem outros significados: no linguajar gaúcho, “bater aspas”, quer dizer bater a orelha. Como expressão popular “fincar as aspas” é o mesmo que cair de cabeça para baixo. E “fincar as aspas no inferno” é o mesmo que desejar a morte à pessoa indesejável. Ou invejada. Em tempos risonhos e francos, as pessoas tinham inveja. Pura e simplesmente inveja. Com o advento do Facebook, agora surgiu não se sabe de onde a “inveja branca”. Com aspas.

Aspas para Aldous Huxley: “Posso simpatizar com a dor de uma pessoa, mas não com os seus prazeres. Há algo curiosamente monótono na felicidade dos outros”. 

Todo marido traído tem aspas. Quem bebe socialmente não usa aspas para reconhecer que é alcoólatra. O padre que nos perdoe, “até que a morte os separe”, só com aspas. Sem aspas, o futebol perde a sua graça: “Vamos continuar trabalhando forte”, diz o desolado lateral; o volante fez “o que o professor mandou”; o esforçado atacante “não estava numa fase boa”; e o técnico “continua prestigiado”.

 Fim de tarde, ele liga para casa: “Vou passar no bar da esquina para tomar um chopinho e logo estou em casa”. Com aspas, ela acredita: “Que bom, logo hoje que fiz aquela sopinha de ervilhas!”. Na boate de luz vermelha, o galã de meia idade exige: “Serve dois uísques do bom!”. O garçom levanta uma das sobrancelhas e pergunta: “Do bom com aspas ou sem aspas?”.    

Aspas para George Bernard Shaw: “O castigo do mentiroso não é o de que deixam de acreditar nele, mas o de que ele passa a não acreditar em ninguém”. 

Para quem chegou ao fim de tantas aspas, um bom fim de semana. Se chover, com aspas. Se der sol, sem aspas.