Santa Felicidade perdeu na semana passada, 15 de julho, um dos seus personagens mais expressivos. Até alegórico, se considerarmos o seu jeito de viver, falar, de vestir e, sobretudo, o bigode: estava na cara que Almir Logarini era um italiano típico, cujo apelido era justamente Bigode. “Mustacchioni”, cujas pontas ficavam enroladas para cima.

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Bigode deve estar hoje jogando truco na eternidade com Poty Lazzarotto, outro italiano de bigode ilustre. Conhecido por todos em Santa Felicidade, Almir Logarini foi uma figura rara e cara. Ainda morava num grande e valorizado terreno, que vai da Avenida Manoel Ribas até a Via Vêneto, ao lado do Clube Iguaçu. Pelas fotos acima, talvez o leitor já tenha se deparado com o italiano andando naturalmente a cavalo pelas ruas do bairro. Fazia seu próprio vinho, fabricava salame e jogava “mora” como ninguém (diz-se “môra”, aquele jogo que só a italianada consegue entender, no qual se vai batendo o punho e espalhando os dedões na mesa. Ganha quem acerta o número total de dedos. Tudo no meio de grande algazarra, gritaria em dialeto e vinho sangrento da colônia).

Pescador e caçador (quando ainda era permitido caçar), era um boa-praça de muitas histórias, que fazia parar a praça para ouvi-las. Diz-se que certa vez, pescando no Pantanal, pulou na água e trouxe um jacaré pela mão. Também no Mato Grosso, alguns amigos testemunharam quando, depois de matar um porco que seria assado para a turma de pescadores, ele mesmo limpou o bicho na munheca. Por mais que o caseiro da fazenda lhe apresentasse várias facas especiais para limpeza, o grande Almir pediu apenas água quente e, com as mãos, foi limpando os intestinos, a carne, retirando a pele e os pelos. Em 10 minutos a carne estava limpa e pronta para a churrasqueira.

Grande Almir, grande churrasqueiro, grande cozinheiro: paca com polenta mole, costelinha de porco com polenta brustolada, granito de boi assado na brasa eram as especialidades do “cuoco”.

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Logarini não bebia pouco, muito celebrava a vida. Quando saía com os amigos para vistoriar os bailes de Santa Felicidade, contam que Logarini não levava dinheiro. Levava apenas um abraço para o gaiteiro, o vinho do barril caseiro e muitas flores para dançar com as moças. Cenas inesquecíveis são as dele, depois de ter tomado muita “fernet” com tônica, cantando, a plenos pulmões, “Mérica, Mérica”, hino de louvor a seus antepassados.

A missa de Sétimo Dia foi realizada no domingo passado na igreja de Botiatuvinha. Partiu do nosso convívio um italiano típíco, quase em extinção porque o progresso engoliu dos descendentes muitos hábitos dos “nonni”, dos pioneiros “oriundi”.  Dona Dite se despediu do marido com “un bel mazzolino di fior”.

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