Quando Curitiba completar 500 anos, pouco vai sobrar do que temos hoje. Bem provável, os livros de Dalton Trevisan, os desenhos de Poty, o Restaurante Madalosso, as calçadas da Rua Saldanha Marinho (tombadas pelo patrimônio histórico), o projeto do Metrô, e uma polêmica: Quem criou Curitiba? Ébano Pereira ou Jaime Lerner?

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Como se sabe, os historiadores de Curitiba estão divididos entre requianistas e lernistas. Os seguidores da escola requianista sustentam que Curitiba começou em busca do ouro: em meados do século 16, surgiram os primeiros boatos da existência de minas de ouro nos campos serra acima. Foi uma correria em Paranaguá. Muitos afirmavam que a maior jazida se localizava onde hoje é o Palácio Iguaçu, uma premonição que atraiu os primeiros garimpeiros para a região. E que até hoje continua atraindo.

Em 1649, Ébano Pereira, comandou uma expedição exploratória para subir os rios e atingir o planalto em busca de ouro. Para tanto, Ébano pegou a laço uns caiçaras da Vila de Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá. Com saudade do peixe frito, alguns voltaram para o caniço e o samburá, outros se estabeleceram na margem esquerda do rio Atuba, entre a Vila Perneta e o atual Bairro Alto. Como não acharam nem um dente de ouro naquele charco que era o Atuba, posteriormente mudaram-se para um local mais salubre, às margens do rio Ivo, atual centro de Curitiba.

De lá pra cá, diz-se à boca pequena que Ébano Pereira em um visionário. O que o explorador queria mesmo era abrir uma picada entre Curitiba e Paranaguá, para posteriormente cobrar pedágio. Isso sim, uma verdadeira mina de ouro.

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Os historiadores lernistas são revisionistas. E com certa razão, porque até 1971 Curitiba não existia. Pelo menos na mídia nacional. Só depois que Jaime Lerner criou a Rua das Flores é que a cidade nasceu para o mundo. Até então, “os curitibanos não passavam de uma estranha tribo que se alimentava de pinhões”.

Reza na cartilha dos historiadores lernistas que a escolha do sítio foi determinada no século XVII pelo cacique Tindiquera, o touro-sentado dos pinheirais. Insistentemente assediado pelos homens de Ébano Pereira, depois de muitas negociações o chefe tingui decidiu ceder parte de suas terras para a povoação. Com os caras-pálidas atrás, em fila indiana, Tindiqüera caminhou até onde é hoje a Praça Tiradentes e ali parou. Observou a direção do vento e, de repente, fincando no chão a sua lança, disse a famosa e misteriosa frase:

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– Táki-Keva!

E, sem ao menos se despedir, o cacique foi-se embora.

Os povoadores brancos ficaram de boca aberta. O que Tindiquera queria dizer? Como não havia nenhum tradutor presente, chegaram à versão óbvia:

– É aqui!

No dia seguinte os colonos consultaram um tradutor tingui, que revelou o mistério:

– Táki-Keva quer dizer o seguinte: “Arquiteto faz o resto!”

Tindiqüera foi o primeiro urbanista de Kur’yt’yba. Quando Curitiba completar 500 anos, a polêmica entre requianistas e lernistas ainda vai persistir: Quem criou Curitiba? Ébano Pereira ou Jaime Lerner? Até lá, a única unanimidade curitibana é quanto à mãe de Curitiba: Helena Kolody, que nos amamentou de poesia.

Qual?

Damos nomes aos astros… / Qual será o nosso nome / nas estrelas distantes?

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Dedico a coluna de hoje ao leitor Amauri Lago (Jacaré), o taxista que fez questão de me levar de graça até o Passeio Público, no sábado, para o lançamento de Curitiba: melhore defeitos, piores qualidades, livro que já está nas boas livrarias (Curitiba, Chain, Ghignone e  Saraiva).