Não se sabe o que fez tremer mais a cidade de L’Aquila, na Itália, onde se realiza a reunião dos sete países mais industrializados do mundo e a Rússia, o G8: os tremores de 2,4 graus na escala Richter, ou a declaração do ministro Celso Amorim de que “o G8 morreu, não representa mais nada”. Barak Obama tremeu 3,4 graus de medo, na escala Amorim.

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Depois do terremoto econômico global do ano passado, nada mais apropriado que o cenário de L’Aquila para essa reunião do G8. E com efeitos especiais: na manhã de ontem novos tremores de terra de 2,4 graus, em meio a um esquema de segurança que prevê a transferência do encontro para Roma, se os abalos superarem os 4 graus. Portanto, nenhuma surpresa a cena do Barak pulando a janela de pijama.

Se essa reunião dos “moribundos” do G8 não servir para muita coisa, que pelo menos Barak Obama não seja seduzido por Berlusconi (como tantas “modelos e atrizes” italianas ) e ouça os relatos das vítimas do terremoto de abril passado. Como esse da italiana Laura, que usou da internet para contar o “dia seguinte”. Com tradução feita em casa, um trecho da Carta de Laura:

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“Oi a todos. Escrevo de Colle di Roio (L’Aquila), a minha cidade. Acho muito difícil ordenar o turbilhão de pensamentos que me embaralham a cabeça, mas tentarei. E escrevo porque creio ser um instrumento pelo qual a rede permita conhecer outras verdades, sem mediação a não ser do autor.

Nosso acampamento é habitado por cerca de 300 pessoas, distribuídas por uma quarentena de barracas. Retornada de férias jamais iniciadas, procuramos dar uma contribuição às atividades de gestão da “Tendópolis”.

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Não sou técnica, nem tenho qualquer experiência de gestão logística e de pessoal em situações de emergência, e tudo que conto pode estar viciado por um estado de fragilidade emotiva. O fato é que, frente a um esforço de muitas das pessoas presentes no nosso acampamento, infelizmente estamos sendo abatidos pelo sistema organizativo.

A esplêndida máquina das ajudas, por tudo que eu vi, apoia suas sólidas e certamente antissísmicas bases nos ombros e na força dos voluntários; o resto dá a impressão de dramática improvisação. E não porque não se saiba trabalhar ou não haja instrumentos e meios, mas simplesmente porque foi estupidamente subestimado o problema, desde o início.

Se é verdade que um terremoto não é previsível, é também verdade que todos os tremores precedentes deveriam representar um sério monitoramento. Porque não foi divulgado o fato de que, duas semanas antes do terremoto, algumas edificações ruíram miseravelmente.

Uma pessoa minimamente inteligente, à frente de uma estrutura grande como a Defesa Civil, teria que ter destacado os próprios integrantes às portas da cidade, como um exército pronto a qualquer acontecimento. Em vez disso, me encontro a contar que as primeiras barracas do nosso acampamento foram montadas pelos cidadãos abalados pelo sisma, com ajuda de um punhado de voluntários; que falta uma coordenação entre os grupos avulsos presentes; que a secretaria do acampamento (que tentamos fazer funcionar) se manteve ativa com um PC portátil, de minha propriedade, e com outro de um voluntário; e aquilo que conseguimos botar em pé é mérito da inteligência de alguns jovens e de seus instrumentos técnicos; que tivemos que chamar quem desinfetasse e transportasse montanhas de roupas, porque chegaram sujas e inutilizáveis; que temos uma torneira para trezentas pessoas, nenhuma ducha, cerca de 20 banheiros químicos e nenhum tipo de aquecimento para as barracas.

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Alguma coisa de bom, porém, aprendi. E recebi presentes. São as lágrimas de muitas das pessoas que trabalharam na “Tendópolis”, brotando na hora das saudações; são as palavras e os olhares dos velhos da cidade, que misturam dignidade e medo, coragem e resignação, sem um lamento sequer.

As virtudes humanas, as suas misérias, não têm fronteiras. Se quiserem, peço fortemente que enviem esta mensagem a todos os amigos.

Saudação a todos, Laura.