Carnaval dos contrários

Se o Carnaval de Curitiba merecesse um memorial, poderíamos também chamar o local de Museu dos Paradoxos. E na sala de entrada aquele jornal do século passado que convidou os curitibanos para os bailes carnavalescos, com o destacado aviso: “Fica proibida a entrada no salão do instrumento musical chamado cuíca”.

Outra de nossas contradições que mereceriam destaque no memorial seria a história da finada Não Agite, a primeira escola de samba propriamente dita do Paraná, nos moldes do Carnaval carioca. Em se tratando de folia, a Não Agite era uma contradição que só poderia nascer numa cidade com tantos contrários ao batuque. À parte o paradoxo, uma escola de samba num clube de futebol fundado por alemães é um despautério. Mas, com esse nome, quem não a conheceu nos tempos em que ainda era um bloco carnavalesco ficaria abismado.

Só um Museu do Carnaval para provar aos desafetos do mestre Wilson Martins que, sem dúvida, somos um “Brasil Diferente”. Um Brasil diverso, mas nem por isso alheio à fuzarca. Na terra dos contrários, o carnaval nos tempos das sociedades operárias como a dos Barriqueiros do Ahú deixaria os atuais inimigos do Momo de queixo caído. Muitos dos que hoje pregam a extinção da fuzarca não sabem o que perderam na era dos blocos, depois transformados em escolas de samba, com todas as formalidades, infelizmente.

Perguntem à velha guarda coxa branca o tamanho da empolgação do Não Agite: saía do Alto da Glória, tinha uma parada obrigatória nas confeitarias Cometa e Pérola; continuava descendo a Rua XV de Novembro e vinha outra parada no Trocadero. Com os foliões devidamente abastecidos, no que hoje se chamaria de “pit stop”, os blocos iam para a Avenida Luiz Xavier (a Boca Maldita, sim senhor) cantando sambas e marchinhas da época, e “garrafa cheia não queriam ver sobrar”. 

Áureos tempos, até o comércio faturava com os blocos, nas ruas e nos clubes: a Casa Edith, por exemplo, de janeiro a fevereiro só vendia artigos carnavalescos. Com o lança-perfume absolutamente dentro da lei, no centro da cidade eram licenciadas mais de 500 bancas para vender artigos carnavalescos.

Naqueles ido da Carmem Miranda, carnaval de rua era privilégio de branco. Menos na altura do nº 1.100 da Silva Jardim, onde rolava samba e um pouco de jazz. Era puxado pelo motorista de táxi Nicanor, o Bola Sete, com o mestre Claudionor e mais quatro bambas que formavam não um sexteto, mas um “seispreto”. Só mesmo na Curitiba dos contrários, um “seispreto” de jazz.

No rol dos paradoxos o Carnaval do bar Ao Distinto Cavalheiro que acontece hoje no final da tarde: dez mesas, uma orquestra e 500 foliões estacionados naquela calçada de esquina. É ver pra crer!