Carnaval do Centro Cívico

Pergunta recorrente nos últimos dois dias: “Qual Paraná acaba primeiro, o Clube ou o Estado?”. Nenhum dos dois, arrisco responder, porque muito antes da bancarrota dos dois Paranás, o Carnaval de Curitiba estava moribundo e, mesmo respirando por aparelhos, desafiou a própria morte.
Quem mais escreveu sobre o Carnaval de Curitiba foi o falecido jornalista Aramis Millarch (1943-1992), o primeiro a registrar a polêmica que já provocou boas e calorosas discussões: “A existência ou não de um espírito carnavalesco em Curitiba já foi assunto de muito debate e há alguns anos, um dos mais influentes assessores do prefeito Jaime Lerner, ainda em sua primeira administração, queria convencê-lo a cancelar a concessão de verbas para as escolas e aplicá-las em outros eventos, para que Curitiba tivesse uma inovação: já que nosso Carnaval é fraco, por que não transformar o feriadão numa ‘estação de repouso’, com eventos como concertos de música erudita, dança, etc.? É claro que a ideia não foi aprovada e o nome do assessor mantido em segredo, pois quando Mestre Maé, da Colorado; Afunfa, da Mocidade Azul, e o lírico Chocolate, da Ideais do Ritmo, souberam da sugestão, queriam transformá-lo em salsicha”.

Destes três grandes carnavalescos, Chocolate (Mansueden dos Santos Prudente, 1933-1984) era um lírico no sentido de um autêntico malandro do compositor popular. E como bom malandro, tinha sensibilidade de quem não precisava ser nenhum doutor para explicar porque o Rei Momo curitibano vive com um pé na avenida e outro na cova.

Numa das entrevistas que fiz com o Chocolate, numa época em que eu assinava com o nome de Pedrinho Ripinique uma coluna de Carnaval aqui nesta Tribuna do Paraná, o controvertido sambista me dizia: “O próprio negro de Curitiba é frio, tem vergonha de participar. Então ele fica sem colocação, tem medo que o povo diga assim: ‘Ah! Este macaco aí já está se exibindo!’. Assim, ninguém reconhece o nosso gabarito. Para assistir o Carnaval ele assiste, mas vai com medo, entende? Por causa do preconceito de que Carnaval é coisa de preto e de branco sem-vergonha, como a cachaça, é que os brancos distintos não se metem”.

Chocolate vivia do Carnaval, não tinha vergonha de confessar a dificuldade de arrebanhar pastorinhas para o seu rebanho: “Fazer Carnaval em Curitiba é dificultoso. Eu sempre me pergunto: o pessoal do bairro não vem aqui porque a escola é pobre, de gente humilde? Eu acredito que não, o povo é burro mesmo. Na vizinhança, existem oito igrejas de crente, uma católica, e acho que mais de 50% da população frequenta esses cultos. Os únicos corais que existem são das igrejas, e ali é um fanatismo louco. É muita igreja para pouco bairro. O pior é que já sou visado, pois sou macumbeiro mesmo, eles têm medo de chegar!”.

Voltando à pergunta do primeiro parágrafo – “Qual Paraná acaba primeiro, o Clube ou o Estado?” -, pelo barulho que vem do Centro Cívico, tudo pode acontecer. Pode até acabar em samba, porque o Carnaval curitibano é duro na queda e os deputados têm rebolado direitinho na passarela do governador.