Burros e burradas

Basta levantar os olhos. Quem passa pela Praça 19 de Dezembro, junto ao Homem Nu e à Mulher Desnuda, observa no alto do mural de azulejos os muares do Poty Lazzarotto comendo o mato do Passeio Público. Às vésperas dos 320 anos de Curitiba, parece que os jumentos de carga há muito tempo estão num regime de engorda para as comemorações. Clicada na tarde de sábado passado, a fotografia é uma versão contemporânea da obra de Poty que nem mesmo o surrealista Salvador Dalí imaginaria. E observem que não é obra de pichadores. É obra dos mestres do desleixo.

Os burricos do Poty, símbolo dos tropeiros que alargaram nossas fronteiras, fazem parte do mural que conta a história do Paraná. Embora não seja notório, um dos nossos mais importantes tropeiros se chamava Chico Bento, o pai de Anita Garibaldi, companheira de Giueseppe Garibaldi e também heroína dos dois mundos.

Nascido em São José dos Pinhais, de onde vinham os mais afamados tropeiros, Chico Bento passou grande parte de sua vida em lombo de mula, entre Laguna e Lages. Era casado com a mãe de Anita, Maria Antônia de Jesus Antunes, filha de pai sorocabano, um boiadeiro que conduzia tropas com charque e outros produtos que abasteciam as regiões mineiras. Bentão e Maria Antônia se estabeleceram em Laguna, onde ele acreditava encontrar maiores oportunidades de trabalho.

Aninha do Bentão morreu na Itália, no dia 4 de agosto de 1849, e foi enterrada sete vezes. Bentão da Aninha deve ter morrido numa invernada, e bem por isso São José dos Pinhais devia erguer um monumento ao tropeiro, com Chico Bento montado em lombo de mula.

Os são-joseenses só não podem ter como exemplo as burradas de Curitiba, aqui onde os muares são tratados com o mato da negligência e do desapreço.