Buraco do tatu

Curitiba, para assombro dos incrédulos, apresentou ao Ministério do Planejamento o projeto preliminar do metrô. As obras devem começar em 2010, porém o projeto tem muitos poréns. O principal dos poréns, diz a minha ignorância, deve ser esse tal de “impacto ambiental”, relatório contratado pela prefeitura.

Sinceramente, pouco entendo desse tal de “impacto ambiental”. O que eu sei, é de ler no jornal. Florianópolis, por exemplo, aquela ilha de 44 praias, vive de costas para o mar porque, sem estudos de “impacto ambiental”, o nativo não tem onde guardar uma canoa. No litoral do Paraná é a mesma coisa, só que aqui o “impacto ambiental” de maior proporção é observado nos cofres públicos.

Posso estar enganado, mas tenho a impressão que esse tal de “impacto ambiental” é uma corruptela do que no século passado chamávamos de “burocracia”. Afinal, o Brasil se livrou daquela cultura cartorial que herdamos de Portugal. É um “impacto cultural”. Somos modernos, “burocracia” é coisa do passado: agora temos “impacto ambiental”. O que antes demandava uns bons três anos para carimbar papéis nos órgãos públicos para então começar uma obra, agora é preciso um ano de reuniões técnicas, milhares de assinaturas nos cartórios ambientais (com milhares de dólares) para saber se o buraco do metrô não vai entrar em conflito com o buraco do tatu. E ainda assim aguardar possíveis demandas jurídicas.

Para não passar por completo ignorante, fui consultar no google o que afinal seria esse tal de “impacto ambiental”. Está assim: “Impacto ambiental é o efeito causado por qualquer alteração benéfica ou adversa causada pelas atividades humanas ou naturais no meio ambiente. As ações humanas sobre o meio ambiente podem ser positivas ou negativas, dependendo da intervenção desenvolvida. A ciência e a tecnologia podem, se utilizadas corretamente, contribuir enormemente para que o impacto humano sobre a natureza seja reduzido”.

Indubitavelmente (taí uma palavrinha para provocar impacto), esse tal de “impacto ambiental” é coisa de primeiro mundo e Curitiba, sendo uma cidade de primeiro mundo, não poderia deixar de adotar tamanha modernidade para abrir um buraco do centro da cidade até a Arena da Baixada. É um trecho pequeno, no entanto, pleno de ameaças ao meio ambiente. A começar pelos tanto rios subterrâneos que atravessam a cidade, todos canalizados em concreto e transformados em esgotos. Qualquer alteração nesse emaranhado de fossas poderia causar prejuízos ecológicos irreversíveis.

E o que dizer então do “impacto ambiental” que as obras do metrô podem causar à natureza viária do centro de Curitiba? O automóvel, como se sabe, é o cidadão mais respeitado da cidade. Está acima do bem e do mal. A cada dia mais veículos ganham “status” privilegiado e não se tem notícia de que algum órgão competente tenha exigido relatório de “impacto ambiental” da indústria automobilística.

Com todo o respeito aos ambientalistas, e eles merecem, mas esse tal de “impacto ambiental” chegou um pouco tarde. Devia ter surgido por volta de 1913, quando Henry Ford (11 investidores e 28 mil dólares de capital) formou a Ford Motor Company.

Então, Henry Ford se reúne com as autoridades e apresenta o projeto de produção em grande quantidade de automóveis a baixo custo, por meio da utilização do artifício conhecido como “linha de montagem”: um carro a cada 98 minutos, além dos altos salários oferecidos a seus operários, no valor de 5 dólares por dia.

Depois de inúmeras reuniões, estudos de engenharia e viabilidade econômica, colocam à frente da Ford Motor Company uma última exigência: relatório de “impacto ambiental”.

– My God! exclama o homem de Detroit.

– Sorry, mister Ford: a ciência e a tecnologia podem, se utilizadas corretamente, contribuir enormemente para que o impacto humano sobre a natureza seja reduzido.