Bundas abundam

Dizia Stanislaw Ponte Preta, o maior estudioso da alma brasileira, que se a lei funcionasse, bastaria uma para corrigir o Brasil: “Artigo único – Todo brasileiro passa a ter vergonha na cara”.

O problema desta tão sucinta e abrangente legislação é que o brasileiro não sabe a diferença entre vergonha e pouca-vergonha. O que se sabe, de pai pra filho desde os velhos carnavais, é que pouca-vergonha trata-se da licenciosidade e da sensualidade que deixam o vigário rubro de indignação no sermão da quarta-feira de cinzas.
– É uma pouca-vergonha tantas genitálias expostas ao mundo!

– Com hífen ou sem hífen no meio? – pergunta o aplicado coroinha na sacristia.

Quanto à vergonha propriamente citada por Stanislaw Ponte Preta, a palavra teria origem num equipamento de tortura chamado “gogna” (foto), usado na Idade Média para castigar os devedores e caloteiros. Ameaçadas de passar por uma situação humilhante, as pessoas diziam que iam ver a “gogna”. Ou seja, seriam torturadas na “gogna”. Dai nasceu a palavra em italiano “vergogna”.

Em Florença ainda existe a chamada “Pedra da Vergonha”, uma roda de mármore colocada no centro do “Mercato Nouvo”. Quando foi construído, em 1547, a poucos passos da Ponte Vecchio, esse Mercado era o local de venda de seda. Depois passou a ser chamado de Mercado da Palha, pois ali eram vendidos os famosos chapéus de palha de Florença. Hoje é um mercado de artigos de couro, uma “piccola” versão do enorme Mercado de San Lorenzo.

Esta pedra do Mercato Nuovo marca o local onde eram punidos os devedores insolventes. O castigo consistia em acorrentar os caloteiros, abaixar as calças e bater suas nádegas repetidamente na pedra: “Ostendendo putenda, et percutiendo lapidem culo nudo” – e assim os fiorentinos preferiam morrer a dar com a bunda na pedra.

Em outras cidades italianas existia o “bonorum cessio culo nudo super lapidem” (dar os bens a nádegas nuas sobre uma pedra). Neste caso, o devedor deveria dizer: “Cedo bona!” (dou meus bens para o pagamento). Desse castigo nasceu a expressão “Essere con il culo aterra” (ficar com a bunda no chão).

Com suas origens italianas, o juiz Sérgio Moro deveria desconhecer os trâmites da Justiça brasileira e instituir a Pedra da Vergonha. Como se sabe, neste país a vergonha é pouca e bundas abundam!

Paraná Online no Facebook