Bloco do come, bebe e dorme

Serra acima, serra abaixo, o campeão deste Carnaval foi o Bloco do Come, Bebe e Dorme. Chovendo a cântaros, os foliões devem se concentrar em torno daquela mesa e de lá não mais sair enquanto não faltar apetite. O carnaval do brasileiro também é a festa da gula. Do Oiapoque ao Chuí, o banquete do Momo é levado à mesa com versos como estes:

“Oia como se bebe / Esse povo do Brasil / Inxuga um garafom / Mais depressa q´um funí / Mi´a Santa Catarina / Santa de cabelo loro / É uma santa milagrêra / Qui mora ni pé de moro”.

De Santa Catarina ao Rio Grande do Sul, onde a prenda se veste de baiana e sai arrastando a saia para o gaúcho da fronteira:

“O vinho é coisa santa / Nascida da cepa torta; / Que a uns faz perder o tino, / A outros errar a porta / Se tu és, vinho, robusto, / Eu sou quem te busco; / Se derem comigo na lama, / Bravos toré / Darei contigo na cama”.

E lá nas bandas de São Paulo, a rapaziada ergue um brinde às belas morenas presentes:

“Papagaio, periquito, / Saracura, sabiá, / Todos comem, todos bebem / As morenas do Brasil! / O vinho na garganta delas / Corre mais que num funil”

   No litoral do Paraná, a festa em torno da mesa não é muito diferente. Sendo que aqui a dieta do Momo é com o barreado, a comilança nascida entre fandangos, tamancos e rebecas que é feita para durar três dias e três noites, com a panela de barro sendo sucessivamente reaquecida até o último herói da resistência. Desde 1884, a gastronomia é o enredo de Carnaval, como mostra a letra de convocação para um banquete de 200 talheres:

 “Após o baile, que terminará à meia-noite, recolher-se-ão todos à caverna dos petiscos para degustar do banquete com o seguinte cardápio:

Boa sopa de sapo terão todos / E também muita lesma com fartura / De minhocas um bom molho se terá, / E mil moscas afogadas em gordura!

De ensopados camundongos abundância, / Boas tortas de barata catinguenta, / Das cascudas, descascadas, em conserva, / E muquecas da Bahia com pimenta!

De pulgas um piche será presente / Assim como também piolho frito; / E um gato escaldado mostrará / Como é bom com batata e mangarito!

Percevejo recheado com banana. / Pernilongo simplesmente ferventado, / Marimbondo temperado com azeite, / Carrapato levemente sapecado.

Jatutá do visgoso com farinha, / Perereca da graúda em boa banha, / Mucuim com forçura de galinha / Lagartixa misturada com aranha!

Baiacu, garoupa, badejeto, bagre, / Amborê, vinagre, timbucu, pescada, / Cação, robalo, parati, tainha, / Acará, sardinhas, caçonete, espada!

Variedade completa (à escolha) para todos os gostos, todos os paladares! Reunamo-nos todos e demos guerra de extermínio a essa petisqueira. Mostremos enfim que bem soubemos aproveitar o Carnaval de 1884.

Assinado, Zebedeu: chefe do Bloco do Come, Bebe e Dorme.