Quem foi que disse que Curitiba não tem segundo turno? Ele começou com os 77,27% dos votos válidos de Beto Richa e não vai acabar tão cedo. O segundo turno alcança 2010, quando os eleitores de Curitiba vão conhecer o resultado da reeleição: Beto Richa será candidato a governador? Ser ou não ser, eis a questão.

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Desde 5 de outubro, quando fecharam a contabilidade, esse segundo turno veio transcorrendo de forma branda. A campanha só tomou corpo com o deputado Gustavo Fruet reconhecendo, enfim, o óbvio ululante: o PSDB terá de ter, por força de um candidato próprio a presidente, um candidato próprio ao governo do estado em 2010.

– Eu não disse? deve estar uma fera a bela Gleisi Hoffmann, com o dedo em riste exigindo a reconsideração dos 778.514 votos de Beto Richa.

Gleisi Hoffmann pode estar injuriada, mas foi feita a vontade da companheira: temos o segundo turno e são esses os candidatos: Beto Richa, Osmar Dias, Álvaro Dias e o marido da dona Gleisi, o ministro Paulo Bernardo. Quem será o vencedor? Saberemos em outubro de 2010, no terceiro ou quarto turno.

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Em suma: o primeiro turno ao governo do Paraná é a eleição do prefeito de Curitiba.

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No livro Meus Vizinhos Italianos, o escritor inglês Tim Parks conta sua vida na aldeia de Montecchio, no Vêneto. Irônico, Parks transmite tudo aquilo que um inglês típico estranharia num país tão diferente do seu. Quase uma caricatura, é uma crônica retratando personagens do cotidiano, a predileção pelo vinho engarrafado em casa, a amizade, a culinária. Meus Vizinhos Italianos tem um sabor especial para nós brasileiros: reconhecemos nos costumes e na vida italiana muito do que ocorre no Brasil. Nos reconhecemos até nas leis locais. Sempre há um “jeitinho italiano” de burlá-las. Existem as leis que pegam e as que não pegam: “Há uma coisa que o político italiano percebe de um modo que o seu ingênuo equivalente inglês não o faz: impopular é a aplicação da lei, e não a lei em si, a qual é manifestamente uma coisa boa e constitui a resposta certa para qualquer problema que ela pretenda solucionar, do mesmo modo que é certo para o papa insistir na castidade, desde que cada um faça como melhor entender”.

Na sociedade anárquica modelar da Itália, existe um sem-número de leis cujo valor nunca será questionado. E, sob esse disfarce ladino, todos vivem como acham que devem viver.

Discreto, Válido, Relativo: essa a fórmula italiana para discutir política. Uma das satisfações do italiano é achar que, com essas três palavras, ele fez uma análise acurada da situação, apreendeu suas ironias, avaliou os prós e os contras e concluiu como um analista astuto, observando todo o espetáculo à distância.

E essa fórmula pode ser aplicada em qualquer discurso. Sobre dirigir bêbado, por exemplo:

– Sim, a nova lei sobre dirigir embriagado, elaborada discretamente (ou seja, muito bem, com inteligência, até talento), na verdade é na maior parte válida (sensata, funcional), mas tudo isso é relativo (só tem importância secundária), já que os instrumentos para a aplicação da lei não estão disponíveis ou, se estão, ninguém tem intenção de usá-los.

Beto Richa pode abdicar de dois anos na prefeitura, passar o cargo ao vice e se candidatar ao governo do Paraná? Para responder a pergunta, me lembrei da fórmula genérica dos Meus Vizinhos Italianos: Discreto, Válido, Relativo. Um típico curitibano de Santa Felicidade, de origem vêneta, responderia assim:

– Beto Richa é Discreto. Quando perguntam, responde que ainda é muito cedo para discutir a questão e que, no momento, só está pensando em tocar as obras que começou. No entanto, é Válido ele se candidatar a governador, em 2010. Beto Richa é jovem e o Paraná precisa renovar suas lideranças políticas. Se o prefeito for candidato, tem o meu voto. Contudo, o processo político é Relativo: até lá, para governar o Paraná, o PSDB pode optar pela Fernanda Richa!