Com o câmbio tão desvalorizado quanto um ingresso no Couto Pereira, o peso argentino tornou-se um pesadelo para los hermanos que sonhavam em passar o verão jogando futebol nas praias brasileiras. Principalmente a classe média portenha, a grande ausente nas estatísticas para esta temporada que promete, como sempre, muito chororô.

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Saudades dos gringos, quando nos verões passados nos desafiavam para o grande clássico latinoamericano na areia. Cada time com sete jogadores na linha e um no gol, de um lado a seleção brasileira de Balneário Camboriú, com a gloriosa camisa amarela: Maringá; Joinville, Leite Quente e Pato Branco; Caiobá, Escurinho de Itajaí, Ribeirão Preto e Pé-Vermelho. Reservas: Cascavel, Ponta Grossa, Caxias, Tietê e Canasvieiras. Técnico: Manezinho.

Do outro lado, a escalação de turistas, envergando a temida azul-celeste argentina: Patagônia; Corrientes, Gardelón e Malvinas; Topo Gigio, Bariloche, Córdoba e Torrado. Reservas: Rozado, Magrón, Kuke, Caminito e Boca. Técnico: Mendoza.

Em torno do campo, em menor número, os gringos se empanturravam de milho verde e churros. Majoritários, os brasileiros faziam fila para a caipirinha dos quiosques. Por trás dos edifícios da Avenida Atlântica, o sol fazia sombras ao trânsito congestionado. Bem, amigos… mediando a porfia, um corajoso e invocado baixinho, robusto feito o Maradona, mas brasileiro de Mato Grosso. A regra é clara, alertou Sua Excelência o baixinho árbitro: trinta minutos para cada lado, bola na segunda onda é lateral, não vale pé no ouvido e quem xingar a mãe do juiz vai pro chuveiro do quiosque. Pelo sonoro apito inicial, brasileiros e argentinos sentiram que o baixinho não levava desaforo pra Mato Grosso. E rolou a pelota.

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Os brasileiros abriram o placar aos vinte do primeiro tempo, quando o atacante Pé-Vermelho roubou a bola na primeira onda, tocou no meio para Escurinho de Itajaí que driblou um, driblou dois, passou pelo goleiro Patagônia, entrou com bola e tudo e correu pro abraço. Pelas barbas do profeta! Torcedores argentinos foram comprar milho no quiosque.

No segundo tempo, a Argentina passou a pressionar. Os brasileiros recuaram “os beque”, sentindo a reação inimiga. Pressão total, quando aos dezoito do segundo tempo saiu o gol de empate. O zagueiro Leite Quente deu carrinho na lateral, botando um gringo pra beber água salgada na arrebentação. Gardelón bateu a falta e Maringá espalmou. No rebote, o gol argentino. Foi só milho verde e churros que voaram na comemoração da torcida portenha.

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Com 1×1 no placar, o Brasil equilibrou a partida tocando a bola, os gringos administrando o resultado. Aos 23 da etapa final, Bariloche e Pato Branco se estranharam numa bola dividida junto ao calçadão da Avenida Atlântica. Pra piorar, a bola espirrou, quebrando o vidro de um carro importado. O baixinho de Mato Grosso, mostrando personalidade, expulsou os dois atacantes. O técnico argentino Mendonza protestou e também foi para o chuveiro do quiosque.

Faltando meio minuto para o final da porfia, escanteio para o Brasil. Confusão na área. Sua Excelência o baixinho de Mato Grosso tentou botar ordem na casa, inutilmente. Com 16 homens embaixo da trave argentina, Ribeirão Preto bate o escanteio. A bola subiu espetacularmente, o vento leste fez a pelota parar no ar e cair perpendicularmente bem no olho do furacão, num emaranhado de gente.

Afastado do caos, o baixinho de Mato Grosso trila o apito. Pênalti para o Brasil!

Os portenhos partiram pra cima do baixinho de Mato Grosso, com cocos verdes nas mãos. Entre os brasileiros, um Carnaval fora de época. E era só sabugo de milho que voava e argentino que chorava.

Horas depois, ainda escondido no interior do Hotel Marambaia, o juiz baixinho de Mato Grosso desabafou:

– Empatar com os gringos, aqui na nossa praia… nem sobre o meu cadáver!