Do escritor Arnoldo Monteiro Bach, o último capítulo do assalto ao trem ocorrido em 1929, depois da Guerra do Contestado. A pavorosa aventura de um certo coronel Fabrício na divisa entre o Paraná e Santa Catarina.

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O saque rendeu pouco e o bando, chefiado pelo coronel Fabrício, estava disposto a prosseguir até Mafra e saquear as duas cidades, Mafra e Rio Negro, e dali voltar a Canoinhas. José Cassou era agente da estação ferroviária de Mafra. Experiente, ficou intrigado com o silêncio dos aparelhos e com o sumiço do trem de passageiros. Então, resolveu chamar a próxima estação, a de Barracas, e pediu um “pode” simulado para um trem de forças do Exército, cuja mensagem foi captada pelo telegrafista do bando, que avisou o coronel.

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NR. Em função do espaço, aqui peço licença ao autor Arnaldo Monteiro Bach e corto três parágrafos do texto original, para retomar a narrativa num ponto que julgo não prejudicial à compreensão da aventura: o coronel Fabrício obstrui uma possível passagem do trem do Exército, bate em retirada e poupa algumas outras povoações de novos saques.

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De volta a Jararaca, outras duas locomotivas foram largadas na linha, uma sentido Mafra e outra sentido Porto União. Os funcionários foram liberados e os aparelhos de telégrafo, inutilizados. A partilha seria feita na fazenda Chapéu de Sol, do coronel Fabrício, no Paraná.

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A primeira mala a ser aberta seria a do tenente pagador, que ficou com o tenente Enéas, homem de maior confiança do coronel. Forçaram o fecho, mas não conseguiram abri-lo. Impacientes, arrebentaram a tampa e, para a decepção de todos, só havia roupas femininas. As outras malas também foram abertas e só havia roupas.

– Diabos! Fomos enganados! reclamou o Coronel, desapontado.

No dia seguinte, a direção da Rede, autoridades policiais e o Exército tomariam as providências para restabelecer o tráfego de trens. Procederam a uma busca minuciosa nos vagões de onde foram retirados objetos desprezados pelos saqueadores. Depois da revista geral, apenas uma mala comum de viagem foi retirada debaixo de um assento de primeira classe que viajara indo e voltando a Marcílio Dias, com dezenas de bandidos. A mala e os outros objetos foram enviados à estação de Mafra e entregues a José Cassou. Cassou jogou a mala embaixo de sua mesa, onde permaneceu por algum tempo, até que um dia o maquinista Napoleão chegou dizendo:

– No dia do assalto eu carregava uma mala, com roupas da minha esposa, que desapareceu da locomotiva. Por acaso ela está aqui?

– Aqui tem uma.

– É essa mesma! disse Napoleão.

No entanto, a esposa de Napoleão reagiu dizendo que não era aquela mala e devolveu-a a Cassou, que a colocou novamente debaixo de sua mesa.

Tempos depois, o tenente, que portava a mala com o dinheiro no dia do assalto, em conversa na estação de Mafra com José Cassou, comentou sobre o desaparecimento da mala com o dinheiro.

– Depois do assalto foram recuperadas várias malas de passageiros e devolvidas aos seus donos. Só uma mala, que foi encontrada debaixo de um assento do vagão de primeira classe, ainda está no meu escritório, porque não sabemos de quem é informou Cassou.

– Então é a mala do dinheiro? Por segurança eu guardei debaixo do assento do trem e pediu para vê-la.

Cassou concordou, porém, por precaução, pediu a presença dos superiores do tenente, de diretores da Rede e abriu a mala que, além de objetos de uso pessoal, continha 180.000$000 (cento e oitenta mil réis), a mesma quantia que o tenente portava no dia do assalto. Todos ficaram surpresos.

– Eu nunca imaginei que essa mala era a que trazia o dinheiro! Achei que ela estava com os bandidos. Agora, assine esse recibo que comprova a entrega da mala – disse Cassou, aliviado.

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NR. O fim do coronel Fabrício: um dia, ao passar pela cidade da Lapa, foi denunciado e preso pelo delegado Nabi Mansur Paraná, que o reconduziu para Canoinhas. No entrevero com a polícia, o filho de Conceição Sete Facadas foi assassinado e o coronel Fabrício, atingido por um tiro de raspão.