Assalto ao trem de passageiros (1)

Baseado no assalto ao trem de pagamento da Central do Brasil, ocorrido em 1960 no Rio de Janeiro, o filme O assalto ao trem pagador, dirigido por Roberto Farias, é de 1962. Muito antes, em 1929, depois da Guerra do Contestado, aconteceu no Paraná um assalto nos trilhos que daria um roteiro tão atraente quanto o do filme carioca.

O “Assalto ao trem de passageiros”, na linha Curitiba-São Francisco do Sul e Porto União, está relatado no livro Trens do escritor Arnoldo Monteiro Bach, que entre outras obras escreveu Alemães do Volga (origem da família Bach) e Carroções. Nascido em Palmeira e autor de grande sucesso editorial nos Campos Gerais, o professor Bach foi buscar na história oral do Paraná o relato de uma história à espera de um cineasta.

Na aventura comandada por certo coronel Fabrício não faltam cenas de terror, violência, assassinatos, estupros, raptos, suspense e, se bem temperado, um desfecho com muito humor.

Por se tratar de uma narrativa bem além da conta deste espaço diário, O assalto ao trem de passageiros será publicado na forma de um folhetim, nos três próximos dias. Se ao leitor é uma folga do cronista, ao signatário desta coluna é uma homenagem a Arnoldo Monteiro Bach, pesquisador que remontou um episódio da nossa história que poucos conhecem.

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A guerra terminou, mas ninguém está dispensado, – disse o coronel Manoel Fabrício Vieira ao seu bando de vaqueanos, com o fim da Guerra do Contestado. Coronel Fabrício queria continuar com homens, principalmente com os de confiança, a cumprir suas ordens. Entre eles havia vaqueanos certeiros de pontaria e também hábeis no manejo com arma branca, provados em entreveros durante a guerra.

Os outros chefes civis, como Pedro Ruivo, dispensaram seus grupos, mas continuaram vivendo como no tempo da guerra, espalhando pânico nas cidades vizinhas ao conflito. Com eles, Neco Vacariano e Adão Mendes, conhecido como Adãozinho, entre outros, cometeram atrocidades em Serro Verde, Pangará, Estiva, Mafra, Papanduva e por onde passavam.

Coronel Fabrício fez posse e legalizou uma considerável área de terras à margem direita do Rio Iguaçu, em frente à estação de Jararaca, Felipe Schmidt (SC), a qual denominou Fazenda Chapéu de Sol. O sustento do coronel e de seu grupo vinha da extração da erva-mate, corte de lenha para a estrada de ferro e para os vapores que navegavam no Rio Iguaçu.

Não muito afeitos a esse árduo trabalho, o grupo comandado pelo coronel Fabrício e seu genro Salvadorzinho, conhecido como Dente de Ouro, fazia incursões por fazendas na fronteira SC-PR, com saques e até raptos de donzelas. Homem odiado pela população da região, o coronel Fabrício, no regresso de suas barbaridades, cuidadoso, não voltava diretamente para sua fazenda. Hospedava-se na fazenda de algum conhecido e ali permanecia até quando se sentisse seguro para voltar. Nessas propriedades, quando havia tentativas de saques por outros bandos, durante a presença do coronel Fabrício e de seu grupo, prevalecia a lealdade em consideração à hospitalidade do amigo e a fazenda era defendida até as últimas consequências.

Certa feita, Salvadorzinho, o Dente de Ouro, acostumado a espalhar maldade por onde passava, encontrava-se em Valões. Ali, o valentão teve um entrevero com a polícia e tombou morto. Nunca se soube, ao certo, quem foi o matador. Substituiu-o na chefia do bando, a convite do coronel Fabrício, um indivíduo com extensa ficha no mundo do crime, filho de Conceição Sete Facadas. A fama do coronel e de seus comparsas, na prática de atrocidades, ganhou fronteiras e ele já aceitava algum trabalho extra, que consistia na eliminação de pessoas inimigas dos que podiam pagar por esse trabalho, entre outros golpes.

Foi então que o coronel Manoel Fabrício Vieira planejou o mais ousado golpe de assalto a trem de passageiros.