Amores e ardores

Estalactite é pra baixo, Estalagmite é pra cima.

Foram feitos um para o outro. Tite e Mite estão se conhecendo há anos. Namorados, quase casados. Moram no mesmo prédio, mas dividem a mesma caverna em dias de não e em dias de sim. Em dias de não, Estalagmite mora com a mãe no apartamento de baixo. Em dias de sim, ela fica com Estalactite, no teto de cima. Estalactite, o Tite, mora em cima. Estalagmite, a Mite, mora embaixo.

Mite e Tite se conheceram na Ilha do Mel. Embaixo do céu que nos protege e do sol que nos revigora, ela estava na Gruta das Encantadas passando bronzeador (Rayto de Sol, aquele argentino de velhos carnavais que vendiam junto com o lança-perfume) quando Tite se agachou na sua frente: “Você passaria o batom nos meus lábios?”.

Assim, mais que de repente, Mite ficou quase que abismada. Tite delicadamente passou o carmim nos próprios lábios e, depois de correr lascivamente sua língua de serpente de um canto ao outro da boca, pediu mais: “Pode cuidar da minha cadeira? Vou buscar uma cerveja e já volto”.

Estalagmite jamais soube de cantada igual. A primeira tinha sido de seu pai, nos anos 1970, ao abordar a sua mãe no baile da Garota de Caiobá, promoção do Dino Almeida. Ele escreveu assim num maço de cigarros MINISTER (Minha Inesquecível Namorada, Isto Será Tua Eterna Recordação).

Por não fumar, a mãe de Mite respondeu com a mesma marca da Souza Cruz, de traz pra frente: RETSINIM (Recuso Essa Tua Suja Insinuação, Não Insista Mais).

Ao retornar com duas cervejas na mão, Estalactite largou as latinhas embaixo do guarda-sol e se jogou ao mar em socorro da Estalagmite: “Me ajude, estou pegando fogo!”.

Era uma água-viva grudada ao longo da coxa. Tite ergueu Mite nos braços e a levou à sombra da baixa vegetação da ilha. Naquele tempo, água-viva era raridade. Uma loteria, digamos.

“Como não temos vinagre para a limpeza, cerveja também serve” – sugeriu o doutor palpiteiro. Com a flanela de limpar os óculos escuros, ele iniciou a operação pelo dedinho do pé e foi até a nuca da paciente. Quando ela gemeu com um friozinho na barriga, ele ronronou no ouvido dela: “Doeu?”

Sozinhos naquele vazio da Ilha do Mel, com duas latinhas de cerveja Estalactite e Estalagmite voltaram para Curitiba com o corpo em chamas.

Hoje, quando o casal esfria a relação, ela fulmina o canalha no círculo restrito de amigas do facebook: “O traste é uma água-viva que grudou na minha vida!”.