Aguarde, Mr. President

Como era previsto e até cheguei a comentar aqui, os cartunistas e humoristas americanos estão numa “saia-justa” com Barack Obama. Com a bandeira branca nas mãos, por enquanto os cartunistas só observam, estão na tocaia. Na primeira oportunidade, os engraçadinhos não vão perdoar nem os avós quenianos do negão.

Aqui eu já havia feito a pergunta: “Com o devido respeito e a necessária irreverência, como podemos ainda tratar o Mr. President? Como o politicamente correto afro-descendente, ou então na linguagem popular: neguinho, negão, preto, pretinho, pretão, ou crioulo, meu irmão?”

Gary Trudeau, primeiro cartunista a ganhar o prêmio Pulitzer e o melhor sobre política do país, também foi o primeiro a arrumar encrenca, mas a favor: no começo da semana passada mandou adiantada sua série completa aos jornais. Na tira de quarta-feira, antes das eleições, afirmava que Barack Obama havia sido eleito. Muitos jornais recusaram a publicar a tirinha, entre eles o Los Angeles Times (o Washington Post aceitou).

A tira só saiu agora.

Assim como Gary Trudeau, cartunistas celebram a saída de Bush, alvo de piadas fácil demais! Para os chargistas, satirizar o novo presidente vai ser desafio muito maior. Gostam do moreno, muitos o apoiaram, mas guerra é guerra. Perde-se o amigo, mas não se perde uma piada. Por enquanto, é paz e amor. Aguarde, Mr. President. É uma questão de tempo, os cartunistas do planeta não vão demorar para atacar com suas línguas ferinas e caricaturas virulentas. Se nem Maomé escapou da pena afiada e irreverente, por que o simpático e bronzeado inquilino da Casa Branca será poupado?

Se o caro leitor permite, como eu estava cultivando abobrinhas aqui no sul do mundo, transcrevo o que a Agência Reuters colheu. O chargista Ted Rall afirma que está impaciente para esquecer o atual presidente republicano George W. Bush. “Fazer piada dele é tão fácil, é coisa de criança”, afirmou em um debate sobre humor, organizado em um teatro de Nova York depois da eleição do senador democrata negro à Casa Branca. “Falar de Obama vai ser muito mais divertido”, prevê.
A maioria dos artistas americanos é democrata convicta e os alvos preferidos deles são os republicanos. Desde que apareceu no cenário político como candidata a vice, a governadora do Alasca, Sarah Palin, se tornou a vítima predileta dos comediantes, em particular Tina Fey, que demoliu a imagem dela com suas paródias.

Agora os comediantes se dedicam a estudar Obama. “É distante, rígido, vai ser algo fascinante”, disse Rall, que proclama com orgulho suas convicções liberais.
A comediante Roseanne Barr acredita que a presidência de Obama vai ser uma fonte de inspiração e “elevará o nível intelectual das piadas”. Para Roseanne Barr, será “uma ironia muito pungente”. Seu colega Robert George, um ator negro, ri com alguma preocupação: “Piadas agudas sobre um homem negro?”

Para a atriz Lizz Winstead, uma coisa é garantida: as piadas alcançarão o objetivo. “O tema será o poder e como o exerce. Colocará tudo a perder? Vai se tornar egocêntrico?”, questiona. “Claro que sim”, responde Ted Rall. “Sempre é assim”, conclui.

O jornal satírico The Onion (A Cebola) já faz graça com Obama. Na edição mais recente publicou, por exemplo, um artigo com o título:
– Um negro recebe o pior emprego dos Estados Unidos!
“Falem mal, mas falem de mim”, dizia o general Médici, para logo em seguida botar os alegres rapazes do Pasquim na cadeia.

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Com Obama, quem está feliz mesmo é o papa Bento XVI.
Diz o Times de Londres que a eleição norte-americana pode abrir caminho para a escolha de um papa negro. Segundo o arcebispo de Atlanta, Daniel Gregory, 60, o santo padre teria sugerido que a eleição de um pontífice negro enviaria “uma mensagem esplêndida ao mundo”. O papa alemão poderia ir tratando de acelerar
o processo, os humoristas ficariam bem agradecidos.